DECRETO N. 5837 - DE 26 DE DEZEMBRO DE 1874
Approva o Regulamento para a construcção, conservação, trafego e policia dos carris urbanos.
Hei por bem Approvar o Regulamento que com este baixa, para o serviço de construcção, conservação, trafego e policia dos carris urbanos, no municipio da Côrte, assignado por José Fernandes da Costa Pereira Junior, do Meu Conselho, Ministro e Secretario de Estado dos Negocios da Agricultura, Commercio e Obras Publicas, que assim o tenha entendido e faça executar. Palacio do Rio de Janeiro em vinte e seis de Dezembro de mil oitocentos setenta e quatro, quinquagesimo terceiro da Independencia e do Imperio.
Com a rubrica de Sua Magestade o Imperador.
José Fernandes da Costa Pereira Junior.
Regulamento a que se refere o Decreto nº 5837 desta data, para o serviço de construCção, conservação, trafego e policia dos carris urbanos
CONSTRUCÇÃO, CONSERVAÇÃO E TRAFEGO
Art. 1º O Serviço de construcção, conservação, trafego e policia das linhas de carris urbanos no municipio da Côrte, far-se-ha sob a immediata inspecção de Engenheiros Fiscaes nomeados por Portaria do Ministerio da Agricultura, Commercio e Obras Publicas.
Art. 2º Nenhuma concessão de carris terá lugar, no municipio da Côrte, quér para novas linhas, quér para o prolongamento das actuaes, sem que tenha sido apresentada ao Ministerio da Agricultura, Commercio e Obras Publicas, uma planta do traçado com indicação das curvas, declives, cruzamentos e desvios necessarios; e bem assim das propriedades que tiverem de ser desapropriadas, e das ruas e estradas, que se tiverem de abrir, alargar ou desviar.
Art. 3º Na construcção das linhas, além do que fór especialmente estatuido em referencia a cada uma, serão observadas as seguintes regras:
1º Os trilhos serão de fenda; o seu peso por metro corrente e a sua secção serão approvados pelo Ministerio da Agricultura, Commercio e Obras Publicas, que sómente em casos excepcionaes, como o de ascensão em fortes declives, e outros da mesma natureza, poderá autorizar o emprego de carris de diverso systema.
As linhas de trilhos, quando forem singelas, serão assentadas de um lado das ruas, de maneira que fique perfeitamente livre o transito nos passeios.
2º Poderão ser assentadas linhas duplas ou desvios nas ruas e estradas de 11 metros, pelo menos, de largura, ou onde fôr isto indispensavel para facilidade do trafego, precedendo neste caso approvação da Illma. Camara Municipal.
Se, porém, a experiencia mostrar que dahi resulta inconveniente ao transito, ou perigo para os transeuntes, deverão as emprezas remover uma das linhas, logo que assim o exigir o Engenheiro Fiscal, e dentro do prazo que lhes fôr fixado, sob pena de ser a remoção executada administrativamente á custa das mesmas emprezas.
3º A extensão livre dos desvios comprehenderá, sempre que fôr possivel, pele menos o comprimento de dous trens, incluidos os respectivos animaes.
4º O espaço comprehendido entre as linhas não será, em caso algum, inferior a um metro.
5º Será calçado pelas emprezas o espaço comprehendido entre os trilhos, e nunca menos de 0m,35 para cada lado exterior, quando não haja calçamento nas ruas ou estradas em que forem assentados os mesmos trilhos.
As disposições do presente artigo, que constituirem onus para as actuaes emprezas, serão executadas de conformidade com os respectivos contractos.
Art. 4º Antes de dar começo aos trabalhos, as emprezas fornecerão ao Engenheiro Fiscal desenhos de execução; da fórma de ligação dos carris; secção transversal da linha e cópia da planta geral approvada, onde se mencionem os raios das curvas, desvios, cruzamentos; e bem assim os planos das estações, que deverão ser approvados pelo Ministerio da Agricultura, Commercio e Obras Publicas, e de quaesquer outras obras da linha que interessem ao publico.
Art. 5º O assentamento dos carris só terá lugar nas ruas e estradas indicadas na planta previamente approvada pelo Ministerio da Agricultura, Commercio e Obras Publicas.
Art. 6º O trabalho de assentamento dos trilhos será executado do modo por que fôr indicado pelo Engenheiro Fiscal e Engenheiro da Illma. Camara Municipal, tendo-se em vista o que tiver sido estipulado no contracto com a respectiva empreza.
Será, porém, prohibido assentar trilhos nas ruas e estradas sem que se prendam ao seguimento das linhas, ou interromper os trabalhos por mais de 48 horas sem que seja refeita a parte do calçamento, ou aterrada a da estrada que tiver sido revolvida, salvo caso de força maior.
Art. 7º A conservação dos carris far-se-ha com a maior vigilancia, para o que serão frequentemente examinados por agentes da respectiva empreza.
Não poderá esta, em caso algum, conservar os trilhos em nivel diverso das ruas ou estradas onde forem assentados.
Art. 8º A conservação comprehenderá, além da superstructura do caminho, que deverá estar sempre limpo, um espaço de pelo menos 0m,35 para cada lado da borda exterior dos carris.
Art. 9º As emprezas serão obrigadas a repor immediatamente, depois de assentados os trilhos, o calçamento das ruas e estradas no estado em que se achavam quando começaram os trabalhos.
Não poderão em tudo o caso conservar grande extensão de ruas descalçadas ou obstruidas; sob pena de serem feitas administrativamente, á custa das mesmas emprezas, as obras ou o trabalho necessario para a desobstrucção, além das multas em que estas incorrerem.
Art. 10. Nenhuma parte das linhas de carris será entregue ao trafego sem que o Engenheiro Fiscal atteste achar-se toda ella construida de accôrdo com as clausulas da respectiva concessão, e bem assim que foram observadas todas as prescripções exigidas; e que dispõe a empreza do material rodante e do numero de animaes necessarios para o serviço.
Art. 11. Cada uma das emprezas de carris organisará um regulamento de signaes para uso dos cantoneiros e vigias. Esse regulamento deverá ser approvado pelo respectivo Engenheiro Fiscal.
Art. 12. No serviço da tracção não se empregará o vapor ou qualquer outro motor inanimado sem prévio consentimento do Ministerio da Agricultura, Commercio e Obras Publicas.
Art. 13. A approximação dos carros será annunciada, á distancia conveniente, por guizos ou campainhas, que os animaes do tiro deverão trazer ou por qualquer outro meio adequado.
Art. 14. O transporte de passageiros e de cargas, far-se-ha em carros construidos de conformidade com os planos e desenhos approvados pelo Ministerio da Agricultura, Commercio e Obras Publicas.
A lotação dos carros de passageiros, será fixada de accôrdo com o Engenheiro Fiscal, e approvada pelo mesmo Ministerio. Será indicada em algarismos no interior dos carros, e communicada á Secretaria da Policia e á Illma Camara Municipal.
Art. 15. O serviço de transporte de passageiros e de cargas, será regulado por um horario e por tarifas, aquelle approvado pelo Engenheiro Fiscal, e estas pelo Ministerio da Agricultura, Commercio e Obras Publicas.
Nenhuma alteração que eleve as tarifas far-se-ha sem consentimento do Ministerio da Agricultura, Commercio e Obras Publicas; e nem poderá ser executada, sem que tenha sido publicada com antecedencia pelo menos de 48 horas.
Qualquer alteração do horario que diminua o numero de viagens será annunciada com igual antecedencia.
Art. 16. A velocidade dos carros não excederá de 10 kilometros por hora.
Nas pontes ou viaductos, na frente ou vizinhança das casas do parlamento e das Escolas Publicas, e nas linhas que estiverem em reparos, o trajecto far-se-ha a passo e sempre com toda a cautela e vigilancia.
Art. 17. As emprezas poderão, além dos trens da tabella, augmentar occasional ou permanentemente o numero de viagens dos respectivos carros, dando, no ultimo caso, previamente conhecimento ao Engenheiro Fiscal.
Art. 18. Os carros só poderão demorar fóra das estações ou pontos de parada o tempo indispensavel para deixar ou receber passageiros, salvo caso de força maior.
Art. 19. Deverão parar sempre que entre elles e os demais vehiculos se possa dar encontro. No caso de se approximarem dons carros de emprezas diversas, que tenham de circular em uma mesma linha ou atravessar um cruzamento terá a precedencia o da empreza mais antiga.
Art. 20. No serviço da noite, além de illuminados internamente, os carros trarão lanternas de côr fixa em cada uma de suas frentes. Poderão todavia usar de lanternas que illuminem interna e exteriormente.
Art. 21. Os carros cuja lotação não estiver completa, pararão a qualquer signal dos passageiros, salvo achando-se em curvas ou á entrada e approximação dos desvios, caso em que deverão parar logo que transponham esses pontos.
Art. 22. E' expressamente prohibido:
1º Viajar nos carros transportando volumes que não possam ser collocados sob os bancos, no espaço destinado a cada passageiro, ou que incommodem aos demais viajantes; e bem assim trazendo cães ou quaesquer outros animaes, armas carregadas ou materias explosivas.
2º Admittir nos carros pessoas que não estejam decentemente vestidas, ou que se achem em estado de embriaguez.
3º Fumar nos carros que para isso não forem apropriados.
Art. 23. Sempre que se der desencarrilhamento, morte ou queda dos animaes da tracção, ou qualquer accidente do qual resulte interrupção do trafego, a empreza desobstruirá o caminho o mais depressa que fôr possivel, sendo obrigada a reparal-o dentro do maximo prazo que lhe fôr marcado pelo Engenheiro Fiscal, no caso de destruição que provenha do referido trafego, sob pena de serem os reparos executados administrativamente á custa da mesma empreza, além da multa em que esta incorrer.
Art. 24. Quando se derem accidentes de qualquer natureza, que impossibilitem a continuação da viagem, e não possa a empreza transportar até o seu destino os passageiros, que se acharem presentes, restituir-lhes-ha a importancia das respectivas passagens, se o exigirem.
INSPECÇÃO POR PARTE DO GOVERNO
Art. 25. Compete aos Engenheiros Fiscaes velar na execução das clausulas das concessões relativas ás emprezas de carris urbanos; e cumprir e fazer cumprir no que lhes diz respeito, as prescripções do presente regulamento.
Art. 26. Para esse fim cabe-lhes:
1º Exercer constante vigilancia no serviço da construcção, conservação de toda a linha, seu material fixo e rodante e dos transportes; devendo informar ao Ministerio da Agricultura, Commercio e Obras Publicas de todas as occurrencias dignas de menção.
Até o dia 31 de Janeiro de cada anno remetterão ao mesmo Ministerio um relatorio dos factos e mais occurrencias do anno anterior.
2º Fazer sobrestar na construção das obras que não forem executadas segundo as prescripções da arte, ou para as quaes não tenha precedido approvação do Ministerio da Agricultura, Commercio e Obras Publicas na fórma do presente regulamento ou dos contractos celebrados com as respectivas emprezas, dando immediatamente parte ao mesmo Ministerio.
3º Mandar effectuar qualquer reparo de conservação ou reconstrucção a expensas das emprezas, se estas não se apressarem a fazel-o no prazo que lhes fôr marcado, salvo caso de força maior.
4º Mandar refazer á custa das emprezas qualquer parte do calçamento que tenha sido destruida por prepostos ou agentes destas, ou que por negligencia dos mesmos esteja fóra do nivel geral: o que só terá lugar quando as emprezas o não fizerem em prazo razoavel que lhes será marcado.
5º Exigir das emprezas, para prevenir aos transeuntes da approximação dos carros, evitar desastres e limpar os trilhos, o numero de cantoneiros e guardas que fôr necessario.
6º Providenciar para que seja garantido ás emprezas o livre uso das suas linhas; requisitando das autoridades competentes as necessarias providencias para que não seja perturbada a circulação dos carros das mesmas emprezas.
8º Representar ao Ministerio da Agricultura, Commercio e Obras Publicas, a respeito das infracções do presente regulamento e dos contractos com as emprezas; declarando as penas em que estas incorrerem.
DISPOSIÇÕES GERAES
Art. 27. Nenhuma obra nova, que tenha relação com o serviço das linhas de carris, poderá ter começo sem que a respectiva planta seja previamente approvada pelo Ministério da Agricultura, Commercio e Obras Publicas.
Art. 28. Os passageiros que circularem nos carros das emprezas de carris de ferro, ficarão sujeitos ás prescripções dos respectivos regulamentos que estas organizarem para a boa execução do serviço. Esses regulamentos, depois de approvados e rubricados pelo Engenheiro Fiscal, serão affixados no interior dos carros, e communicados á Secretaria da Policia.
Art. 29. Sempre que se der qualquer conflicto entre agentes das emprezas e os passageiros, recorrerão estes ao respectivo Gerente, ou a quem o representar; e não sendo attendidos, ao Engenheiro Fiscal que providenciará immediatamente, conforme o caso exigir.
Art. 30. As emprezas informarão logo ao Engenheiro Fiscal, não estando este presente, e á autoridade policial mais proxima, dos accidentes graves que se derem no serviço da respectiva linha.
Art. 31. Serão ministrados pelas emprezas ao Engenheiro Fiscal todos os dados estatisticos relativos ao movimento, receita e despeza de suas linhas, depois que de tudo tiver sido dado conhecimento aos accionistas; e bem assim as demais informações de que carecer o mesmo Fiscal para desempenho de suas obrigações.
Art. 32. Além dos Engenheiros Fiscaes, que circularão livremente nos carros das emprezas, terão passagem gratuita os empregados publicos ou quaesquer funccionarios e agentes da autoridade que, na fórma dos contractos celebrados com as mesmas emprezas, viajarem por objecto de serviço publico e com passes dos seus superiores.
As praças do corpo de bombeiros, seus offìciaes, e os agentes da força publica e da policia, serão admittidos nos carros que se dirigirem aos pontos onde se derem incendios, ou proximo destes, independentemente da exhibição de ordem escripta ou passe dos respectivos chefes.
Art. 33. Das deliberações tornadas pelos Engenheiros Fiscaes haverá recurso para o Ministerio da Agricultura, Commercio e Obras Publicas.
Art. 34. As disposições do presente regulamento serão executadas de accôrdo com as posturas da Illma. Camara Municipal relativas á viação publica.
Palacio do Rio de Janeiro em 26 de Dezembro de 1874. - José Fernandes da Costa Pereira Junior.