AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 7555
Decisão: O Tribunal, por maioria, a) converteu o exame da medida cautelar em julgamento de mérito; b) julgou procedente o pedido exposto na presente ação direta, declarando-se a inconstitucionalidade do § 3º do art. 232 do Código Penal Militar, incluído pela Lei n. 14.688/2023, com eficácia ex nunc a contar da data da publicação da ata de julgamento; c) julgou procedente o pedido formulado em arguição de descumprimento de preceito fundamental, para declarar a não recepção dos incs. I a III do art. 236 do Código Penal Militar, com eficácia ex nunc a contar da data da publicação da ata de julgamento; e d) aplicou ao crime de estupro de vulnerável praticado por militar no exercício de suas funções ou em decorrência dela e/ou em lugar sujeito à administração militar, após a publicação da ata deste julgamento, toda a disciplina normativa prevista no Código Penal para o crime de estupro de vulnerável praticado por civis, tratando-se do caput e dos §§ 1º a 5º do 217-A do Código Penal, por expressa determinação do inc. II do art. 9º do Código Penal Militar, no qual consta que, na ausência de previsão legal de crime na legislação militar, aplica-se a legislação penal ordinária em tempos de paz. Tudo nos termos do voto da Relatora, Ministra Cármen Lúcia, vencidos os Ministros Cristiano Zanin, Dias Toffoli, Gilmar Mendes e André Mendonça, que julgavam improcedente a ação direta, mas acompanhavam a Relatora no ponto relacionado à modulação dos efeitos da decisão. Plenário, Sessão Virtual de 5.9.2025 a 12.9.2025.
EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. CONVERSÃO DE APRECIAÇÃO DA MEDIDA CAUTELAR EM JULGAMENTO DE MÉRITO. CONHECIMENTO COMO AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE C/C ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL. PRECEDENTES. DIREITO PENAL MILITAR. ESTUPRO DE VULNERÁVEL. INCONSTITUCIONALIDADE DO § 3º DO ART. 232 DO CÓDIGO PENAL MILITAR: AUSÊNCIA DE QUALIFICADORAS. NÃO RECEPÇÃO DOS INCS. I A III DO ART. 236 DO CÓDIGO PENAL MILITAR: PRESUNÇÃO RELATIVA DE VIOLÊNCIA. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE C/C ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL JULGADA PROCEDENTE COM EFICÁCIA EX NUNC. APLICAÇÃO DO CAPUT E DOS §§ 1º A 5º DO ART. 217-A DO CÓDIGO PENAL PARA ESTUPRO DE VULNERÁVEL PRATICADO POR MILITAR: PREVISÃO EXPRESSA DO INC. II DO ART. 9º DO CÓDIGO PENAL MILITAR.
1. O processo está instruído nos termos do art. 10 da Lei n. 9.868/1999. Proposta de conversão da apreciação da medida cautelar em julgamento de mérito, sem necessidade de novas providências.
2. Conhecimento da demanda como ação direta de inconstitucionalidade c/c arguição de descumprimento de preceito fundamental, por serem impugnados dispositivos legais anteriores e posteriores à Constituição da República. Precedentes.
3. É materialmente inconstitucional o § 3º do art. 232 do Código Penal Militar, pela ausência de previsão legal de qualificadoras para os casos em que o crime de estupro de vulnerável resultar em lesão corporal grave, gravíssima ou morte, acarretando apenamento mais brando que o previsto na legislação comum. Vedação ao princípio da proteção deficiente.
4. É de se reconhecer a não recepção dos incs. I a III do art. 236 do Código Penal Militar, por manterem em vigência presunção relativa de violência para casos de estupro praticado por militar contra menores de catorze anos e pessoas com deficiência. Previsão incompatível com o Código Penal, no qual a presunção de violência não admite prova em contrário em estupro de vulnerável. Afronta à proibição de retrocesso.
5. Ação direta de inconstitucionalidade c/c arguição de descumprimento de preceito fundamental julgada procedente para declarar a inconstitucionalidade do § 3º do art. 232 do Código Penal Militar e a não recepção dos incs. I a III do art. 236 do Código Penal Militar, com eficácia ex nunc a contar da data da publicação da ata de julgamento.
6. Declarada a inconstitucionalidade do § 3º do art. 232 do Código Penal Militar, torna-se ausente a previsão legal do tipo penal de estupro de vulnerável no Código Penal Militar, a partir da publicação da ata deste julgamento. Nos termos do inc. II do art. 9º do Código Penal Militar, na ausência de previsão legal de crime na legislação militar, aplica-se a legislação penal ordinária, em tempos de paz. Passa-se a aplicar ao crime de estupro de vulnerável praticado por militar, portanto, a disciplina normativa prevista no Código Penal sobre o tema, isto é, caput e §§ 1º a 5º do art. 217-A do Código Penal, a partir da publicação da ata deste julgamento.