DECRETO N. 4769 – DE 9 DE FEVEREIRO DE 1903
Regula o processo e julgamento das infracções de leis, regulamentos e posturas municipaes do Districto Federal.
O Presidente da Republica dos Estados Unidos do Brazil:
Usando da attribuição conferida pelo art. 48, § 1º da Constituição, resolve decretar que, no processo e julgamento das infracções das leis, regulamentos e posturas municipaes do districto Federal se observe o regulamento que com este baixa, assignado pelo Ministro de Estado da Justiça e Negocios Interiores.
Rio de Janeiro, 9 de fevereiro de 1903, 15º da Republica.
FRANCISCO DE PAULA RODRIGUES ALVES.
J. J. Seabra.
Regulamento a que se refere o decreto n. 4769 desta data
Art. 1º O processo e o julgamento das infracções de leis, posturas e regulamentos municipaes pertencem á Junta de Contravenções Municipaes, composta do juiz dos feitos da Fazenda Municipal, como presidente, e de dous pretores como vogaes.
Os dous pretores serão designados, mensalmente, pelo presidente do Tribunal Civil e Criminal, por escala, na ordem numerica das respectivas Pretorias.
Art. 2º A Junta funccionará duas vezes por semana em seguida ás audiencias do Juizo dos Feitos da Fazenda Municipal. Poderá tambem celebrar sessões extraordinarias quando houver affluencia de serviço, si assim o entender o juiz dos feitos da Fazenda Municipal.
Art. 3º Competem ao juiz dos feitos da Fazenda Municipal todos os actos do processo que não forem privativos da Junta de Contravenções, bem assim a execução das sentenças desta, cabendo-lhe pelos actos que praticar os emolumentos do decreto n. 3363, de 5 de agosto de 1899.
Art. 4º Ultimado o processo administrativo quanto á verificação das infracções, conforme o que dispuzer a legislação municipal, o respectivo procurador dos feitos da Fazenda Municipal requererá ao juiz dos feitos a citação do infractor para se ver processar e julgar na primeira audiencia. A citação será ordenada por despacho daquelle juiz na petição inicial, ou por mandado, conforme houver requerido o procurador dos feitos. Não sendo encontrado o infractor, será elle, por edital publicado no orgão official da Prefeitura, citado para se ver processar e julgar na primeira reunião da Junta, depois de findo o prazo de dez dias contados da publicação do referido edital, salvo, quando se tratar da hypothese do art. 16 e seus §§ deste regulamento.
Art. 5º Na audiencia aprazada, depois de apregoado o infractor, será lido pelo escrivão o auto de infracção; em seguida será qualificado o infractor e se tomará o depoimento das testemunhas de defesa, até o numero maximo de tres, as quaes deverão estar presentes á audiencia.
§ 1º O infractor poderá produzir os documentos que entender convenientes á defesa.
§ 2º Poderá tambem o procurador ou solicitador dos feitos da Fazenda Municipal apresentar testemunhas de accusação, e, neste caso, serão inquiridas antes das de defesa, até o numero maximo de tres.
§ 3º As testemunhas serão inquiridas summariamente e de plano, sem termo de assentada.
Art. 6º Inquiridas as testemunhas, terá a palavra o procurador ou solicitador dos feitos da Fazenda Municipal para produzir a accusação, si entender conveniente, seguindo-se a defesa oral que poderá ser produzida pela propria parte ou por seu bastante procurador, mesmo que não seja advogado. A accusação e a defesa não poderão exceder de um quarto de hora cada uma. Não haverá replica nem treplica.
Art. 7º Terminados os debates, terá em seguida logar o julgamento. O relatorio será, feito pelo presidente da Junta, e, depois da discussão, que será publica, se proferirá o julgamento por maioria de votos. O resultado do julgamento será em acto continuo proclamado pelo presidente, o que feito se haverá a parte por intimada, no caso de estar ella presente por si ou por seu procurador.
§ 1º A Junta só por accumulo de serviço poderá adiar o julgamento. Nesse caso, terá elle logar, impreterivelmente, na sessão seguinte.
§ 2º No caso de adiamento de julgamento e acontecendo não estarem mais em exercicio os vogaes que compunham a Junta do julgamento adiado, serão elles para esse fim especialmente convocados pelo presidente.
Art. 8º Dos depoimentos, debates e mais diligencias se lavrará, em livro especial, summaria acta, da qual se juntará copia aos autos de cada processo na parte a elles relativa, e que será em resumo publicada no jornal official da Prefeitura, cinco dias depois, no maximo, de proferido o julgamento.
Art. 9º Quando, para prova perante a Junta de Contravenções, se requerer vistoria, exame ou qualquer outra diligencia, a parte interessada fará o respectivo requerimento na audiencia da citação, e ahi mesmo se procederão ás louvações, quando for caso disso, marcando-se o prazo de oito dias para a ultimação da diligencia, qualquer que ella seja. Findo o prazo acima referido, sem que o resultado da diligencia seja junto aos autos, proseguirá sem mais demora o feito, que será julgado na primeira sessão que se seguir da Junta de Contravenções. E’ licito ao interessado juntar, como documento ás suas razões de appellação, si assim lhe convier, o resultado da diligencia requerida quando só o obtenha depois do prazo de oito dias.
Esta disposição é commum a Fazenda Municipal e ao infractor, e computam-se nas custas as despezas com as vistorias, exames ou quaesquer outras diligencias, nas quaes funccionará exclusivamente o juiz dos feitos, como preparador.
Art. 10. Quando o infractor estiver presente, por si ou por seu procurador, a appellação será interposta na audiencia do julgamento, independentemente do termo.
§ 1º No caso de revelia, a appellação será interposta por petição sem necessidade de termo, 48 horas depois de publicado o resumo da acta do julgamento no jornal official da Prefeitura, segundo dispõe o art. 8º.
§ 2º A appellação da Fazenda Municipal poderá ser interposta até 48 horas depois do julgamento.
§ 3º A appellação interposta pela Fazenda Municipal ou pelo infractor será apresentada na instancia superior, dentro do prazo de oito dias, a contar da data em que foi interposta, sob pena de se julgar deserta por simples despacho do juiz dos feitos da Fazenda Municipal mediante informação do escrivão.
§ 4º quando a appellação for interposta pelo infractor condemnado, ella só poderá seguir si por elle for paga ou depositada nos cofres municipaes, dentro do prazo a que se refere o § 3º, a importancia da multa e custas.
§ 5º Si a pena for de prisão, só poderá seguir a appellação depois de preso o infractor ou de prestada a fiança. A fiança, que será arbitrada pela Junta de Contravenções na sentença de julgamento, não será superior a 500$, nem inferior a 50$000.
§ 6º Em nenhum caso é necessaria a intimação das partes para sciencia da appellação ou da remessa dos autos á instancia superior, e não haverá nos autos outro despacho de recebimento da appellação que não o proferido na audiencia do julgamento ou na petição mesma em que o recurso for interposto.
Art. 11. As partes poderão juntar ás suas razões de appellação os documentos que entenderem convenientes, bem como justificações que hajam produzido perante o Juizo dos Feitos da Fazenda Municipal, com citação da parte contraria.
Art. 12. Cabe o julgamento das appellações interpostas das decisões da Junta de Contravenções á Camara Criminal da Côrte de Appellação.
§ 1º Quando a Fazenda Municipal for appellante, nenhuma importancia de custas ella terá que desembolsar, sendo as custas pagas, afinal, pela parte vencida, observando-se em tudo o mesmo processo que se observa nas causas crimes em que a justiça publica é appellante.
§ 2º Distribuido o feito, será apenas revisto pelo relator e julgado em mesa, independentemente de passagens.
§ 3º Poderão as partes, inclusive a Fazenda Municipal por seu representante, deduzir verbalmente seu direito, perante a Camara Criminal da Côrte de Appellação, antes de se tomarem os votos e depois de feito o relatorio.
Art. 13. Os processos que correrem perante a Junta de Contravenções são isentos de taxa judiciaria.
§ 1º Os requerimentos, officios, allegações, cotas e quaesquer documentos juntos aos autos pelos representantes da Fazenda Municipal nenhum sello levarão.
§ 2º Esta disposição não se estende aos requerimentos, allegações, cotas e documentos do infractor.
§ 3º Quando for condemnado o infractor, se addicionará ás custas contadas a importancia do sello afim de ser cobrada executivamente.
§ 4º As custas dos procuradores e solicitadores dos feitos da Fazenda Municipal, nos processos da Junta de Contravenções, serão reguladas pelo decreto n. 3363, de 5 de agosto de 1899, ns. 26, 31, 119, 122, 126, 127, Il d, 132, 133 b e 134, sem prejuizo das que lhes couberem por quaesquer outros actos ou diligencias.
§ 5º As custas do presidente e vogaes da Junta serão contadas de accordo com o mesmo decreto n. 3363, ns. 18, 22 e 23 b, e divididas em partes iguaes entre elles. As que competem ao escrivão continuarão a ser as consignadas na secção IV do citado n. 3363, equiparada a secção da Junta de Contravenções á da Junta Correccional.
Art. 14. A simples apresentação em Juizo do auto de infracção lavrado com as formalidades legaes pelo agente, ou qualquer funccionario municipal, para isso competente, fará prova plena relativamente aos factos que delle constarem, sem que seja necessario que os funccionarios que nelle figurarem os venham confirmar em Juizo.
Paragrapho unico. Fica salvo á parte contraria o direito de illidir a fé que mereçam os referidos autos, produzindo as provas que lhe occorrerem.
Art. 15. Caso não se ache presente no dia da sessão da Junta o pretor a quem nella incumbir funccionar, o presidente da Junta convocará extraordinariamente outro pretor.
Art. 16. Nos processos e diligencias referentes a predios, terrenos e obras, sua demolição ou interdicção, será citado o proprietario do immovel, sem dependencia da citação do outro conjuge.
§ 1º Estando ausente o proprietario, e sendo conhecido seu procurador, caso elle o tenha, será este citado e contra elle correrá o processo seus termos.
§ 2º Não sendo conhecidos nem encontrados o proprietario e o procurador, seguirá o processo seus ternos com o curador de ausentes, e, em virtude ee citação edital, até que se apresente alguem pelo proprietario, sem que a este seja permittido o direito a qualquer reclamação contra a Fazenda, Municipal. Os editaes serão expedidos sem dependencia de justificação, e pelo prazo de 10 dias.
§ 3º Apresentando-se o proprietario, ou alguem por elle com poderes bastantes, seguirá o processo seus termos, do ponto em quertlle o encontrar.
Art. 17. Depois de passada em julgado a sentença que condemnar o infractor, baixarão os autos ao Juizo aos Feitos da Fazenda Municipal, e feita a conta da multa e custas, será iniciado o executivo fiscal para a respectiva cobrança, nos proprios autos do processo de infracção, por mandado e independentemente de carta de sentença ou qualquer outra formalidade judicial ou administrativa. A prisão, quando for caso della, se effectuará por mandado.
Art. 18. Nenhum procedimento judicial poderá ser intentado pelo collectado sobre questões relativas a seu negocio, profissão ou industria; nenhuma escriptura publica poderá ser lavrada; nenhuma partilha, divisão, transmissão ou entrega de bens será julgada por sentença, desde que se refiram a negocios ou bens sujeitos a impostos municipaes, sem ser exhibida previamente prova de pagamento ou isenção do imposto do ultimo exercicio, e os respectivos conhecimentos ou certidões deverão constar dos alludidos actos, e de todos os traslados, certidões e sentenças que forem extrahidos, sob pena de multa de 100$ a 500$ ás autoridades ou funccionarios que intervierem naquelles actos, multa essa que será imposta pelo prefeito do Districto Federal, e cobrada executivamente para os cofres municipaes.
Art. 19. Competem á Fazenda Municipal todos os favores e privilegios concedidos á Fazenda Federal, inclusive os do art. 15, § 6º, do decreto n. 3564, de 22 de janeiro de 1900, do art. 31 do decreto n. 3422, de 30 de setembro de 1899 e do art. 7º, § 1º, do decreto n. 3312, de 17 de junho de 1899, sendo applicavel tambem a seus representantes, judiciaes o disposto no art. 51 da lei n. 221, de 20 de novembro de 1894.
Art. 20. As desapropriações em que for interessada a Municipalidade serão reguladas pela mesma lei que vigorar para a União.
Art. 21. Cabe á Fazenda Municipal o executivo fiscal nos mesmos termos e casos em que compete á Fazenda Federal, e seu processo se regulará pelas disposições dos arts. 52 a 68 e 70 a 94 da parte V, titulo 11, capitulo IX do decreto n. 3084, de 5 de novembro de 1898, e art. 22 do decreto n. 9885, de 29 de fevereiro de 1888, com as alterações constantes dos arts. 22 e 23 deste regulamento.
Art. 22. No caso do art. 59, ultima parte, e art. 60 do decreto n. 3084, a citação edital se fará sem dependencia de justificação de ausencia.
Art. 23. No processo executivo fiscal a penhora versará originariamente sobre os immoveis ou seus rendimentos, a juizo do representante da Fazenda Municipal.
Art. 24. Excederão sempre da alçada do juizo, em beneficio da Fazenda Municipal, as causas em que ella for interessada.
Art. 25. Não podem as autoridades judiciarias, quer federaes, quer locaes, modificar ou revogar as medidas e actos administrativos, nem conceder interdictos possessorios contra actos do Governo Municipal exercidos ratione imperii.
Art. 26. Fica salvo ao particular lesado o direito de reclamar, pelas acções competentes, as perdas e damnos que lhe couberem, si o acto administrativo tiver sido illegal, ou si nelle tiver havido excesso de poderes. O juiz se limitará a examinar si o acto em questão foi ou não emanado de autoridade competente, e si está ou não de accordo com as leis e regulamentos administrativos, federaes ou municipaes, em vigor no districto.
Art. 27. Além dos casos previstos na legislação vigente caberá, aggravo de petição dos despachos pelos quaes forem concedidos mandados de manutenção ou prohibitorios.
Rio de Janeiro, 9 de fevereiro de 1903. – J. J. Seabra.