AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 1.625
Decisão: O Tribunal, por unanimidade, entendeu por aplicar a esta ação direta de inconstitucionalidade a mesma tese fixada no julgamento da Ação Declaratória de Constitucionalidade n. 39, a qual manteve a validade do Decreto nº 2.100, de 20 de dezembro de 1996, formulou apelo ao legislador para que elabore disciplina acerca da denúncia dos tratados internacionais, a qual preveja a chancela do Congresso Nacional como condição para a produção de efeitos na ordem jurídica interna, por se tratar de um imperativo democrático e de uma exigência do princípio da legalidade, e, por fim, fixou a seguinte tese de julgamento: `A denúncia pelo Presidente da República de tratados internacionais aprovados pelo Congresso Nacional, para que produza efeitos no ordenamento jurídico interno, não prescinde da sua aprovação pelo Congresso´, entendimento que deverá ser aplicado a partir da publicação da ata do julgamento, mantendo-se a eficácia das denúncias realizadas até esse marco temporal. Redigirá o acórdão o Ministro Dias Toffoli. Presidência do Ministro Luís Roberto Barroso. Plenário, 22.8.2024.
EMENTA
Direito constitucional e internacional público. Ação direta de inconstitucionalidade. Decreto nº 2.100, de 20 de dezembro de 1996. Denúncia da Convenção nº 158 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Denúncia de tratado internacional por vontade exclusiva do presidente da República. Necessidade de participação do Congresso Nacional. Estado democrático de direito e princípio da legalidade. Aplicação do entendimento fixado na ADC nº 39. Improcedência do pedido.
I. Caso em exame
1. Ação direta ajuizada contra o Decreto nº 2.100, de 20 de dezembro de 1996, pelo qual o Presidente da República tornou pública a denúncia à Convenção nº 158 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), a qual dispõe sobre o término da relação de trabalho por iniciativa do empregador. Alegada violação da competência do Congresso Nacional para resolver definitivamente sobre tratados, acordos ou atos internacionais (art. 49, inciso I, da CF/88).
II. Questão em discussão
2. A questão em discussão consiste em saber se seria necessária a manifestação de vontade do Congresso Nacional para que a denúncia de um tratado internacional produza efeitos no direito doméstico, em face do que dispõe o art. 49, inciso I, da Constituição Federal, questão que é suscitada a partir do pedido de declaração de inconstitucionalidade do Decreto nº 2.100, de 20 de dezembro de 1996.
III. Razões de decidir
3. Os arts. 49, inciso I, e 84, inciso VIII, da Constituição Federal indicam uma necessária conjugação de vontades para a adesão do Estado Brasileiro aos termos de um tratado internacional, ou seja, requerem a convergência das competências do presidente da República, a quem cabe celebrar o acordo, e do Congresso Nacional, que exerce função de controle e fiscalização, autorizando a ratificação pelo chefe do Poder Executivo.
4. Manifestação dos freios e contrapesos que caracterizam o exercício compartilhado dos poderes nas democracias contemporâneas, enquanto antítese da autocracia e do totalitarismo, estabelecendo-se procedimentos que conferem legitimidade aos compromissos internacionais assumidos pelo Poder Executivo, para que, com força de lei, eles possam vincular os cidadãos e as autoridades constituídas.
5. Uma vez incorporados ao direito interno, os tratados passam a contar com força de lei ordinária federal, ressalvados os tratados que versam sobre direitos humanos, os quais passam a ter natureza supralegal ou até mesmo constitucional, caso observem o procedimento previsto no art. 5º, § 3º, da CF/88. Como tais, aos tratados se aplicam os mesmos critérios de solução de conflito de normas, como o da cronologia (norma posterior revoga a anterior) e da especialidade (norma especial prevalece sobre a genérica).
6. À luz da Constituição de 1988, decorre do próprio estado democrático de direito e de seu corolário ‒ o princípio da legalidade ‒ que a denúncia de um tratado internacional, embora produza efeitos no âmbito externo diante da manifestação de vontade do presidente da República, requer a anuência do Congresso Nacional para que suas normas sejam excluídas do direito positivo interno.
7. Julgar procedente a presente ação, reconhecendo, por consequência, a inconstitucionalidade do Decreto nº 2.100, de 20 de dezembro de 1996, significaria lançar luz à possibilidade de invalidar todos os atos de denúncia unilateral praticados até o momento em períodos variados da história nacional. Não se pode desconsiderar tratar-se de um costume consolidado pelo tempo e que, não tendo sido formalmente invalidado, vinha sendo adotado de boa-fé e com justa expectativa de legitimidade.
IV. Dispositivo e tese
8. Ação direta de inconstitucionalidade julgada improcedente, com aplicação do entendimento fixado na ADC nº 39, mantendo-se a validade do Decreto nº 2.100, de 20 de dezembro de 1996, e realizando-se apelo ao legislador para que discipline a denúncia dos tratados internacionais, prevendo a chancela do Congresso Nacional como condição para a produção de seus efeitos na ordem jurídica interna.
Tese de julgamento (idem ADC nº 39): A denúncia pelo Presidente da República de tratados internacionais aprovados pelo Congresso Nacional, para que produza efeitos no ordenamento jurídico interno, não prescinde da sua aprovação pelo Congresso, entendimento aplicável desde a publicação da ata de julgamento da ADC nº 39, mantida a eficácia das denúncias realizadas até aquele marco temporal.