DECRETO N. 1382 - DE 19 DE FEVEREIRO DE 1891
Altera clausulas do decreto n. 597 A de 19 de julho de 1890 e concede garantia de juro annual de seis por cento ao capital necessario as obras de que trata o mesmo decreto.
O Generalissimo Manoel Deodoro da Fonseca, Chefe do Governo Provisorio da Republica dos Estados Unidos do Brazil, constituido pelo Exercito e Armada, em nome da Nação, attendendo ao que requereram Trajano Viriato de Medeiros e Alfredo Dillon, e considerando a alta conveniencia de tornar exequivel o levantamento dos capitaes necessarios á construcção de um porto artificial na enseada de S. Domingos das Torres, no Estado do Rio Grande do Sul, com estrada de ferro que ligue a mesma enseada á cidade de Porto Alegre,
decreta:
Art. 1º São modificadas as clausulas do decreto n. 597 A de 19 de julho de 1890, de accordo com as que com este baixam.
Art. 2º Aos referidos concessionarios, ou á empreza que organizarem, é concedida a garantia do juro annual de 6 %, durante vinte annos sobre capital que até ao maximo de 10.000:000$ for effectivamente empregado na construcção do mencionado porto, bem como, por igual prazo, sobre o que tambem effectivamente for applicado até ao maximo de 30:000$ por kilometro á construcção da estrada de ferro, a que se refere o alludido decreto.
O Barão de Lucena, Ministro e Secretario de Estado dos Negocios da Agricultura, Commercio e Obras Publicas, assim fará executar.
Palacio do Governo Provisorio, 19 de fevereiro de 1891, 3º da Republica.
MANOEL DEODORO DA FONSECA.
Barão de Lucena.
Clausulas a que se refere o decreto n. 1382 desta data
I
Dentro doa limites e durante o prazo marcado pelo decreto n. 1382 desta data, faz-se-ha applicavel a garantia do juro annual de 6 % ao capital que for fixado pelo Governo como necessario á construcção de todas as obras, quer do porto com seus accessorios, quer da estrada de ferro; á acquisição do material fixo, fluctuante e rodante; á linha telegraphica, compra de terrenos, indemnizações de bemfeitorias e outras despezas pelo Governo reconhecidas por indispensaveis ao estudo e execução das obras.
§ 1º O capital a que se refere a presente disposição será fixado á vista do orçamento fundado nos planos e mais desenhos de caracter geral, documentos e requisitos necessarios á execução de todos os trabalhos, quer digam respeito a construcção do porto, comprehendendo os seus accessorios, taes como armazens, alpendres, pontes e guindastes, elevadores, pharóes e outras obras e serviços especiaes, quer se refiram ao leito da estrada, ás suas obras de arte e edificios, material fixo e rodante, linha telegraphica e officinas; o que tudo será sujeito á approvação do Governo, não devendo o capital para a estrada exceder do maximo correspondente a 30:000$000 por kilometro. Além destes planos e mais desenhos de caracter geral exigidos, os concessionarios ou a companhia que organizarem sujeitarão á approvação do fiscal, por parte do Governo, os detalhes necessarios a construcção das obras d'arte, um mez antes de dar-se começo á obra, e si, findo esse prazo, os concessionarios ou a companhia não tiverem solução do fiscal, quer approvando-os, quer exigindo modificações, serão elles considerados approvados. No caso de serem exigidas modificações pelo fiscal do Governo, os concessionarios ou a companhia que organizarem serão obrigados a fazel-as; si as não fizerem será deduzida do capital garantido a somma gasta na obra executada sem a modificação exigida.
§ 2º Si alguma alteração for feita em um ou maior numero dos ditos planos, desenhos, documentos e requisitos já approvados pelo Governo, sem consentimento deste, os concessionarios ou a companhia que organizarem perderão o direito á garantia de juros sobre o capital que se tiver despendido na obra executada, segundo os planos, desenhos, documentos e mais requisitos assim alterados.
Si, porém, a alteração for feita com approvação do Governo e della resultar economia na execução da obra, construida segundo a dita alteração a metade da somma resultante desta economia será deduzida do capital garantido.
Por estudos e planos, quanto ao porto, comprehende-se a planta, projecto e orçamento com detalhes e especificações, que deem perfeita idéa do projecto e completa justificação do orçamento, com sondagens, não só determinando a profundidade da agua na planta, como a natureza do terreno subjacente em que houver de estabelecerem-se os fundamentos das obras; as observações de marés, correntes, ventos e regimen de areias e outros indispensaveis ao perfeito conhecimento das condições do local para os fins desta concessão, typos e systemas de apparelhos, guindastes, etc., tudo acompanhado de memoria expositiva e justificativa.
II
A garantia de juros far-se-ha effectiva, em moeda nacional, livre de qualquer imposto, em semestres vencidos nos dias 30 de junho e 31 de dezembro de cada anno, e pagos dentro do terceiro mez depois de findo o semestre, durante o prazo de 20 annos, pela seguinte fórma:
§ 1º Emquanto durar a construcção das obras os juros de 6 % serão pagos sobre as quantias que tiverem sido autorizadas pelo Governo e recolhidas a um estabelecimento bancario, para serem empregadas á medida que forem necessarias.
As chamadas limitar-se-hão ás quantias exigidas pela construcção das obras em cada anno. Para esse fim os concessionarios ou a companhia que organizarem apresentarão ao Ministerio da Agricultura, Commercio e Obras Publicas, dous mezes antes do começo das obras, o seu respectivo orçamento, quer para as obras do porto, quer para as da estrada, o qual será fundado sobre as mesmas bases em que se fundou o orçamento geral, que serviu de base para fixação do capital garantido.
Decorrido o primeiro anno da entrada das chamadas, cessarão os juros até á conclusão das obras que deviam ser executadas nesse anno; construidas ellas, continuará o pagamento dos juros.
§ 2º Os juros pagos pelo estabelecimento bancario sobre as quantias depositadas serão creditados á garantia do Governo, e bem assim quaesquer rendas eventuaes cobradas pelos concessionarios ou pela companhia que organizarem, como sejam as de transferencias de acções, etc.
§ 3º Nos capitaes levantados durante a construcção não será incluido o custo de material rodante da estrada de ferro, nem o de machinas e apparelhos de qualquer natureza, necessarios ao seu reparo e conservação, o qual só será lançado em conta para garantia de juros seis mezes antes de serem o dito material, machinas e apparelhos, acima referidos, empregados no trafego da estrada.
§ 4º Além da quantia necessaria á construcção das obras em cada anno, a que se refere o § 1º desta clausula, os concessionarios ou a companhia poderão fazer uma chamada de capitaes no principio do primeiro anno, no valor de 10 % do capital garantido, para attender ás despezas preliminares que tiverem feito antes de encetarem-se os trabalhos da construcção.
Neste caso, os juros garantidos de 6 % ao anno serão pagos sobre as quantias que forem depositadas, a contar das datas dos depositos.
§ 5º Entregues ao serviço publico na totalidade ou em parte, a estrada de ferro ou o porto com as suas obras accessorias, os juros correspondentes ao respectivo capital serão pagos de accordo com os balanços de liquidação da receita e despeza, de custeio, exhibidos pelos concessionarios ou pela companhia que organizarem, e devidamente examinados pelos agentes do Governo.
III
A construcção das obras não será interrompida, e si o for por mais de tres mezes caducarão o privilegio, a garantia e mais favores, salvo caso de força maior, julgado tal pelo Governo e sómente por elle.
Si no prazo fixado não estiverem concluidos todos os trabalhos de construcção e entregues tanto o porto como a estrada de ferro ao serviço publico, os concessionarios ou a companhia que organizarem pagarão uma multa de 1 % por mez, até seis mezes, e 2 % por mez até aos seis mezes subsequentes de demora sobre as quantias despendidas pelo Governo com a garantia do juro até essa data.
E si, passados doze mezes, além do prazo acima fixado, não ficarem concluidos todos os trabalhos acima referidos e entregues ao serviço publico, ficarão tambem caducos o privilegio, a garantia e mais favores já mencionados, salvo o caso de força maior só pelo Governo como tal reconhecido.
Nenhuma prorogação de prazo será concedida, sem que por cada mez de prorogação paguem os concessionarios ou a companhia um conto de réis (1:000$000).
IV
As despezas do custeio da estrada comprehendem as que se fizerem com o trafego de passageiros e mercadorias, com reparos e conservação do material rodante, officinas, estações e todas as dependencias da via-ferrea, taes como armazens, officinas, depositos de qualquer natureza, e do leito da estrada e todas as obras de arte a elle pertencentes.
As despezas do custeio do porto comprehendem as que se fizerem com a carga e descarga, guarda e vigilancia das mercadorias, com reparos e conservação de todas as obras do porto e suas dependencias, taes como armazens, alpendres, depositos, edificios e bem assim com os guindastes, elevadores e mais machinismos, material fluctuante e pharóes.
V
Os concessionarios ou a companhia que organizarem obrigam-se ainda:
1º A exhibir, sempre que lhe for exigido, os livros de receita e despeza do custeio e do movimento, quer da estrada, quer do porto, e prestar todos os esclarecimentos e informações relativos ao serviço do porto e da estrada, que lhes forem reclamados pelo Governo, pelos fiscaes por parte do mesmo Governo, ou quaesquer agentes deste, competentemente autorizados; e bem assim a entregar semestralmente aos supraditos fiscaes um relatorio circumstanciado do estado dos trabalhos em construcção e das estatisticas do serviço, abrangendo as despezas do custeio, convenientemente especificadas, não só adoptando-se os modelos e regras já existentes, como podendo o Governo indicar outros para as informações que os concessionarios ou a companhia que organiazrem teem de prestar-lhe regularmente;
2º A acceitar, como definitiva e sem recurso, a decisão do Governo sobre as questões que se suscitarem relativamente ao uso reciproco das estradas de ferro que lhe pertencerem ou a outra empreza, ficando entendido que qualquer accordo que celebrar não prejudicará o direito do Governo, ao exame das estipulações que effectuar e a modificação destas si entender que são offensivas ao interesse do Estado;
3º A submetter a approvação do Governo, antes do começo do trafego da estrada e serviço do porto, o quadro de seus empregados e a tabella dos respectivos vencimentos, dependendo qualquer alteração posterior nesses quadro e tabella, de approvação do Governo, o qual poderá tambem reduzil-os durante o tempo da garantia de juros, ouvidos os concessionarios ou a companhia.
VI
A clausula XII do decreto n. 597 A, de 19 de julho de 1890, fica substituida pela seguinte:
Os concessionarios ou a companhia que organizarem perceberão pelos serviços do porto e nos seus estabelecimentos as seguintes taxas:
1ª Pela carga e descarga de mercadorias e quaesquer generos nos caes que possuirem, em virtude desta concessão, 1 real por kilogramma, exceptuados apenas os objectos de grande volume e pouco peso.
2ª Pela carga e descarga, nas mesmas condições, de objectos de grande volume e pouco peso, até 3 réis por kilogramma.
3ª Por dia e metro linear de caes occupado por navios a vapor 700, réis para os dous primeiros dias e 900 réis em seguida.
4ª Por dia e por metro linear de caes occupado por navios que não sejam movidos a vapor, 500 réis.
5ª Por mez e fracção de mez e por kilogramma de mercadoria ou qualquer genero que houver sido effectivamente recolhido aos armazens dos concessionarios ou da companhia, 2 réis.
Serão sujeitos a esta taxa e recolhidos aos armazens dos concessionarios ou da companhia os generos e volumes que não sejam retirados dos caes pelos interessados nas 48 horas que se seguirem a conclusão do seu despacho pela Alfandega.
6ª Uma taxa supplementar será cobrada pelos concessionarios ou pela companhia, de accordo com as partes, quando entre si convierem prolongar o serviço de carga e descarga, além das horas regulamentares, fixadas pela administração da Alfandega.
7ª Poderão os concessionarios ou a companhia cobrar uma taxa para o serviço de reboque, segundo tabella estabelecida de accordo com o Governo e revista annualmente.
8ª Perceberão mais os concessionarios ou a companhia uma taxa de 200 réis por tonelada metrica de arqueação dos navios que entrarem no porto, na razão da carga e descarga que fizerem, independente das outras taxas.
9ª Os navios que entrarem no porto para receber ordens, fazer aguada ou outro qualquer fim, e não descarregarem, pagarão a taxa de 100$000, sendo de vela; 150$000, sendo vapores costeiros, e 200$000, sendo transatlanticos.
10ª Os concessionarios poderão cobrar de 1 a 10 réis por kilogramma de mercadoria que embarcar ou desembarcar no porto.
11ª Terão igualmente direito a cobrar taxas pelo serviço de pharóes; submettendo á approvação do Governo a respectiva tabella de pregos.
12ª A taxa de armazenagem actualmente cobrada pelas repartições fiscaes, e bem assim a das capatazias da Alfandega, cujo serviço ficará a cargo dos mesmos concessionarios ou da companhia que organizarem.
13ª São isentos de qualquer taxa os navios que conduzirem tropas, mantimentos ou petrechos bellicos do Governo Federal, assim como as embarcações de guerra, e tambem os navios que transportarem sómente immigrantes para o territorio nacional; e bem assim da taxa n. 9 desta clausula os navios entrados em arribada, desde que a sua demora no porto não exceda de 30 dias.
VII
O pagamento de juro como garantia, pelo Governo só se tornará effectivo si o producto das taxas, cuja cobrança é autorizada pelo presente decreto, e o rendimento bruto da estrada não perfizerem a somma necessaria para o juro do capital empregado nas obras á razão de 6 % ao anno.
Ficando entendido que o Governo não se compromette a pagar como juro garantido sinão o que a esses producto e rendimento faltar para perfazer puramente o juro do capital empregado, de accordo com as presentes clausulas á razão de 6 % ao anno.
VIII
Logo que os dividendos excederem a 8 %, o excedente será repartido entre o Governo e os concessionarios ou a companhia que organizarem, cessando essa divisão logo que forem embolsados ao Estado os juros por este pagos.
IX
No que não for alterado pelas clausulas da presente concessão, vigorará o disposto no decreto n. 6995, de 10 de agosto de 1878, quanto ao trafego, trem rodante, tarifas, passagens de Estado, telegrapho, fiscalização, resgate, arbitramento, alienação e multas da estrada de ferro.
X
As disposições das clausulas XLIV, XLIX e LI do decreto n. 597 A, de 19 de julho de 1890, entender-se-hão igualmente com o porto naquillo que lhe for, applicavel.
XI
Si dentro do prazo de doze mezes, a contar da data da assignatura do contracto, não estiver organizada a companhia, si por campanhia houver de executarem-se as obras de que trata a presente concessão, caducará esta.
Caducará igualmente, si no prazo de dous annos, a contar da assignatura do contracto, não forem apresentados os estudos, ou si no prazo de um anno, a contar da data da approvação dos ditos estudos, não for encetada a execução das obras.
XII
A caducidade por qualquer dos motivos previstos na presente concessão affectará a concessão em globo; entendendo-se que a falta de cumprimento das obrigações estipuladas para o porto, que importar aquella pena, affectará por igual a estrada de ferro e vice-versa.
XIII
Os concessionarios ou a companhia que organizarem gozarão dos favores concedidos no decreto n. 528 de 28 de junho de 1890, e posteriores, sobre o mesmo objecto - em terras que atravessar a estrada de ferro.
XIV
Si as obras, a que se refere a presente concessão, houverem de ser executadas por companhia, poderão as da estrada ser executadas por uma e as do porto por outra e distincta companhia.
XV
As despezas do porto, como a respectiva renda, serão discriminadas das despezas e renda da estrada de ferro, tendo aquelle e esta escripturação distincta, e nesta conformidade far-se-ha a divisão dos lucros no fim de cada semestre, procedendo-se do mesmo modo com relação ao pagamento dos juros.
XVI
Findo o prazo do privilegio de que trata a condição 1ª do decreto n. 597 A, de 19 de Julho de 1890, todas as obras do porto, seus accessorios e material, e bem assim as da estrada de ferro, reverterão ao dominio do Governo da União, independentemente de qualquer indemnização.
XVII
Ficam em vigor todas as condições do decreto n. 597 A, de 19 de julho de .890, que não forem expressamente modificadas, alteradas ou revogadas pelo presente decreto.
XVIII
Os prazos marcados pelo presente decreto, bem como pelo de n. 597 A, de 19 de julho de 1890, serão contados da data em que esta resolução for publicada.
Secretaria de Estado dos Negocios da Agricultura Commercio e Obras Publicas, 19 de fevereiro de 1891. - B. de Lucena.