DECRETO N. 659 - DE 12 DE AGOSTO DE 1890

Manda observar as instrucções para o segundo recenseamento da população dos Estados Unidos do Brazil.

O Generalissimo Manoel Deodoro da Fonseca, Chefe do Governo Provisorio da Republica dos Estados Unidos do Brazil, constituido pelo Exercito e Armada, em nome da Nação, resolve que, no segundo recenseamento da população da Republica, a que, na conformidade do art. 15 do decreto n. 331 de 12 de abril do corrente anno, se tem de proceder no dia 31 de dezembro proximo vindouro, sejam observadas as instrucções annexas, assignadas pelo Dr. José Cesario de Faria Alvim, Ministro e Secretario de Estado dos Negocios do Interior.

Sala das sessões do Governo Provisorio, 12 de agosto de 1890, 2º da Republica.

Manoel Deodoro Da Fonseca.

José Cesario de Faria Alvim.

Instrucções para o 2º recenseamento da população do Brazil a que se refere o decreto n. 659 desta data.

Art. 1º No dia 31 de dezembro de 1890 serão recenseados todos os habitantes da Republica dos Estados Unidos do Brazil, em logar e na habitação em que se acharem.

Art. 2º Os habitantes que nesse dia estiverem temporariamente ausentes de sua residencia habitual serão também incluidos no respectivo boletim, com a nota de - ausentes - e a declaração do logar em que se acharem, si for sabido, salvo o caso de ter a pessoa que houver de fazer as inscripções plena certeza de que serão os ditos habitantes recenseados no logar onde estiverem.

Art. 3º O recenseamento será feito por meio de boletins ou listas de familia, formando mappas, segundo os modelos annexos.

Art. 4º Os dados exigidos nestas instrucções comprehenderão:

Quanto ao habitante individualmente: - o nome, a naturalidade (mencionando o estado e o municipio quanto ao nacional, o paiz, a data da chegada ao Brazil e a declaração de ter adoptado a nacionalidade brazileira, quanto ao estrangeiro), a idade (indicada pelo numero de annos e mezes, e, sempre que for possivel, pelo anno do nascimento), o sexo, a raça (si branca, preta, cabocla ou mestiça), a filiação (legitima, illegitima, legitimada, ou si é exposto), o estado civil (solteiro, casado, viuvo ou divorciado), a nacionalidade paterna e materna, os defeitos physicos apparentes (si cégo, surdo-mudo, surdo, idiota, ou aleijado), e a residencia (si diversa daquella em que foi recenseado);

Quanto ás relações de familia: - o anno do casamento, o numero de nupcias, o gráo de parentesco no casal, o numero de filhos (designados o sexo, os defeitos physicos apparentes, quantos vivos e quantos mortos);

Quanto ás relações sociaes: - a nacionalidade, a relação com o chefe da casa, a habilitação intellectual (si sabe ler e escrever, si tem instrucção secundaria ou superior, ou si possue titulo ou diploma scientifico, litterario ou artistico), o culto, a profissão, a renda (da profissão, do emprego ou da propriedade).

Art. 5º Constitue uma familia, para os effeitos do recenseamento, a pessoa que vive só e sobre si, em uma habitação ou parte de habitação, ou um certo numero de pessoas, que, em razão de relações de parentesco, de subordinação, de hospedagem ou de simples dependencia, vivem em uma habitação ou parte de habitação sob o poder, a direcção ou protecção de um chefe, dono ou locatario e com economia commum.

Art. 6º Constituem domicilio especial para os effeitos do recenseamento:

§ 1º Os navios, vapores e barcos mercantes de qualquer categoria fundeados nos portos, rios e aguas territoriaes da Republica, para todas as pessoas de sua tripulação e serviço ou que nelles residam;

§ 2º As capitanias dos portos e capatazias, respectivas, para os homens do mar nellas matriculados e empregados em pequenos barcos do trafego dos portos, da pesca e curta navegação do littoral;

§ 3º Os quarteis, os estabelecimentos de instrucção e de educação militar, as fortalezas, os postos militares e policiaes, os navios de guerra, os arsenaes e seus annexos, as fabricas de armas e petrechos bellicos, os edificios dos pharóes, respectivamente para os militares arregimentados do Exercito e Armada, da Policia, alumnos, aprendizes, guardas, tripolação, operarios, pessoal de officinas, serventes e empregados;

§ 4º As Alfandegas e estações fiscaes, para os guardas, vigias, guarnição de escaleres, de barcas de registro e cruzadores;

§ 5º Os presidios, casas de correcção e de detenção, penitenciarias, cadeias, estações policiaes e dependencias do estado-maior, para os presos e detentos;

§ 6º Os collegios, os seminarios, os asylos, os recolhimentos e os conventos, para os alumnos internos, orphãos, expostos ou desvalidos que ampararem, religiosos e religiosas;

§ 7º Os hoteis, hospedarias, pousadas, estalagens ou casas de pensão, para os que ahi se acharem habitual ou accidentalmente no dia do recenseamento;

§ 8º Os hospitaes, enfermarias, hospicios e casas de saude, para os enfermos e pessoal do serviço;

§ 9º As fazendas, as estancias, os engenhos centraes, os sitios, os trapiches, as fabricas, as officinas e os logares de trabalho industrial de qualquer natureza, publico ou particular, para os administradores, mestres, officiaes, operarios, aprendizes, serventes e empregados em exercicio;

§ 10. Os nucleos coloniaes e os de catechese e as colonias militares, para os immigrantes, os aldeiados e os colonos;

§ 11. As estações mais proximas de estradas de ferro para o pessoal administrativo e as turmas de trabalhadores das linhas em trafego ou em construcção.

Art. 7º A obrigação de receber, encher com todas as especificações do art. 4º, assignar e entregar os mappas ou listas do familia, incumbe:

1º Ao chefe de familia do que trata o art. 5º ou a quem suas vezes fizer;

2º Aos capitães, commandantes ou mestres de navios, aos capitães dos portos ou seus capatazes, aos commandantes militares de terra e mar, de policia e de fortaleza;

3º Aos directores dos estabelecimentos de instrucção e educação militar e das fabricas de armas e petrechos bellicos, aos inspectores dos arsenaes e aos 1os pharoleiros;

4º Aos guardas-móres das Alfandegas e aos chefes das estações fiscaes;

5º Aos directores de presidios, casas de correcção e detenção, penitenciarias, cadeias, ou seus administradores ou carcereiros;

6º Aos directores de collegios, semminarios, asylos e recolhimentos, aos abbades ou superiores dos mosteiros e conventos;

7º Aos donos ou gerentes de hoteis, hospedarias, estalagens, pousadas e casas de pensão;

8º Aos directores ou administradores de hospitaes, enfermarias, hospicios e casas de saude;

9º Aos donos ou gerentes de fabricas, officinas, fazendas, estancias, engenhos centraes e trapiches; aos inspectores ou administradores de obras publicas; aos emprezarios ou empreiteiros de construcções, de edificações, de minas, de caminhos de ferro, estradas, pontes, canaes, aterros e, em geral, de qualquer trabalho de exploração manufactureira, agricola, pastoril ou extractiva;

10. Aos directores, encarregados ou missionarios catechistas das colonias, nucleos coloniaes e aldeiamentos;

11. Aos agentes das estações de estradas de Ferro ou aos encarregados dos serviços de sua construcção, reparo e conservação.

Art. 8º As pessoas que se recusarem a receber, encher ou entregar em tempo e á autoridade censitaria competente os mappas ou listas de familia, ou que na redacção destes ou em sua verificação, commetterem scientemente alguma inexactidão, ou alterarem a verdade dos factos, serão processadas e punidas por crime de desobediencia, (lei n. 1829 de 9 de setembro de 1870, art. 1º § 2º), e pagarão além disso a multa de 20$ a 100$, que será cobrada executivamente pelos agentes fiscaes da Fazenda Nacional.

Art. 9º Para executar, fazer executar, inspeccionar e dirigir os trabalhos do segundo recenseamento geral, haverá em cada parochia, e, quando ella achar-se dividida, em cada districto:

1º Umia commissão censitaria, composta de quatro cidadãos residentes na parochia e conhecedores dos seus limites e habitantes. O Ministro do Interior na Capital Federal e os Governadores nos Estados nomearão os presidentes das commissões censitarias, e, por proposta destes, os outros tres membros das mesmas commissões. Para presidente será preferido, sempre que for possivel, o subdelegado do districto ou quem suas vezes fizer. São indistinctamente obrigados a acceitar o encargo todos os funccionarios publicos de nomeação ou eleição, retribuidos ou não retribuidos, ficando os que não o acceitarem, ou não o exercerem, sujeitos á multa de 200$, imposta pela autoridade que os houver nomeado, desde que não justifiquem a recusa ou renuncia, a juizo da mesma autoridade;

2º Os agentes recenseadores cujo numero for fixado pelo Ministro do Interior, na Capital Federal, e pelos Governadores nos Estados, de accordo com as commissões censitarias ou com as repartições de estatistica, podendo ser para esse encargo designados os inspectores de quarteirão respectivos, si estiverem nas condições de bem exercel-o.

Art. 10. Nos Estados em que houver repartições de estatistica, poderão ellas prestar às commissões censitarias, directa ou indirectamente, o auxilio de suas luzes para o bom desempenho dos trabalhos, salvo si preferirem dirigil-os e executal-os por si, para o que poderão requisitar das repartições geraes dous a quatro empregados disponiveis, quando não bastar o seu pessoal. Esta ultima faculdade é tambem extensiva aos agentes ou empregados enviados para o mesmo fim aos outros Estados em commissão da Directoria Geral de Estatistica. Em todos os casos, porém, para regularidade e harmonia do serviço serão observadas as presentes instrucções.

Art. 11. A' Directoria Geral de Estatistica compete, além da apuração geral:

1º Guiar as commissões censitarias na boa direcção do serviço do recenseamento na Capital Federal ou dirigir e executar por si este serviço, podendo neste caso requisitar do Governo Geral os collaboradores que forem precisos, quando não baste o pessoal existente;

2º prestar ás commissões censitarias dos Estados todos os esclarecimentos que solicitarem para o bom desempenho de seus deveres. Quanto aos Estados onde houver repartição de estatistica, só deve a Directoria Geral intervir quando por aquella não forem resolvidas as duvidas suscitadas;

3º Expedir e receber directamente toda a correspondencia official relativa ao recenseamento, mappas ou listas de familia, na parte que lhe competir, e executar qualquer trabalho que por estas instrucções não estiver a cargo de outra repartição ou autoridade.

Art. 12. Incumbe ás repartições de estatistica ou ás commissões censitarias, conforme estiver o serviço entregue a estas ou áquellas:

1º Dividir o territorio da parochia em tantas secções quantas forem indispensaveis para que as operações do recenseamento, em cada uma dellas, sejam escrupulosa e facilmente executadas por um só agente recenseador;

2º Nomear os agentes recenseadores, devendo recahir a escolha em pessoas que, além de saberem ler e escrever correctamente, sejam intelligentes, activas, probas e muito conhecedoras da parochia ou das secções para que forem nomeadas. Em geral e quando os proprietarios, foreiros, rendeiros, administradores ou feitores se prestarem a fazer o recenseamento das pessoas que habitarem e trabalharem nas fazendas, estancias, engenhos (centraes ou não) e quaesquer outros estabelecimentos ruraes, serão as terras destes estabelecimentos consideradas secções das parochias a que pertencerem;

3º Distribuir pelos agentes recenseadores o numero de listas de familia ou mappas, correspondente ao numero de fogos e estabelecimentos das respectivas secções;

4º Fiscalizar escrupulosamente as operações dos agentes recenseadores, dando-lhes as instrucções necessarias e resolvendo as difficuldades que occorrerem no decurso das operações;

5º Proceder, depois de terminado o recenseamento, á verificação das listas e mappas, preenchendo as lacunas, rectificando os esclarecimentos inexactos, examinando si os chefes de familia ou de estabelecimentos commetteram erros ou fizeram occultações pelos quaes não dessem os agentes;

6º Impor aos chefes de familia e mais pessoas designadas no art. 7º e aos agentes recenseadores as multas de que tratam os arts. 8º e 14 e remetter á autoridade criminal competente, por entermedio do Ministro do Interior na Capital Federal e dos Governadores nos Estados, os documentos comprobativos da criminalidade;

7º Remetter directamente á Directoria Geral de Estatistica todas as listas da familia, mappas, quadros e mais papeis relativos ao processo do recenseamento, fazendo-os acompanhar de um relatorio circumstanciado dos trabalhos da commissão e dos agentes; bem assim de uma relação das pessoas que, por sua diligencia e bons serviços, se tenham distinguido, indicando a respeito de cada uma a natureza e importancia dos serviços prestados.

Art. 13. A cada um dos agentes recenseadores incumbe:

1º Fazer, dentro dos quinze dias anteriores ao designado para o recenseamento, a distribuição domiciliaria das listas de familia ou mappas, notando na caderneta, que lhe será fornecida pela commissão censitaria, os nomes dos logares, povoações e sitios comprehendidos na respectiva secção, os nomes das ruas, beccos, travessas, praças, estradas e caminhos, os numeros das casas (si os tiverem), com designação das habitadas e deshabitadas, das de um só ou de mais de um pavimento, os nomes dos chefes de familia ou das pessoas a quem incumbe encher as listas ou mappas, o numero de ordem destes, a distribuição feita, e as demais informações exigidas na mesma caderneta;

2º Proceder, nos dez dias posteriores ao designado para o recenseamento, ao recolhimento, por domicilio, das listas ou mappas distribuidos, tomando nota desse recolhimento na caderneta e devendo em cada domicilio ou morada verificar as inscripções com o chefe de familia ou com a pessoa que encheu os boletins, afim de serem corrigidos os erros e as inexactidões. Aos mesmos agentes incumbe encher as listas dos chefes de familia que não souberem ler e escrever, dos que não puderem fazel-o por motivo justificado e dos que se tiverem a isso recusado, podendo os agentes colher dos proprios chefes de familia ou interessados, ou de pessoas da vizinhança, as informações e esclarecimentos necessarios;

3º Entregar, até quinze dias depois do designado para o recenseamento, á respectiva commissão censitaria as listas ou mappas recolhidos e a caderneta de sua secção, acompanhada de uma relação nominal das pessoas que se houverem recusado a receber, encher ou entregar os mappas, com indicação de suas moradas, afim de lhes serem applicadas as penas do art. 8º

Art. 14. Os agentes recenseadores que deixarem de cumprir escrupulosamente e em tempo os seus deveres ficam sujeitos á multa de que trata o citado art. 8º

Art. 15. Os empregados de que trata a 1ª parte do art. 10 serão addidos ás repartições de estatistica, afim de auxilial-as em todos os trabalhos concernentes ao proximo recenseamento, e ficarão sujeitos a todas as disposições disciplinares dos respectivos regulamentos.

Art. 16. Todas as autoridades civis e militares são obrigadas a auxiliar o bom desempenho do serviço do recenseamento, sob as penas dos arts. 8º e 14.

Art. 17. Os bons serviços prestados nos trabalhos do recenseamento são considerados relevantes, cumprindo á Directoria Geral de Estatistica enviar ao Ministro do Interior a relação dos cidadãos que por esses serviços, que serão especificadamente mencionados, se tiverem recommendado á consideração do Governo.

Art. 18. O Ministro do Interior, sobre proposta da Directoria Geral de Estatistica, fixará a quantia de que poderão dispor a Capital Federal e cada Estado para diversas despezas com este serviço, e de accordo com as commissões censitarias da mesma capital a gratificação dos agentes recenseadores, quando não forem empregados publicos e não se prestarem a servir gratuitamente. Nos Estados a gratificação dos agentes recenseadores será fixada pelos Governadores, de accordo com as repartições de estatistica ou com as commissões censitarias, tendo em vista o credito distribuido para as despezas com o recenseamento.

Art. 19. Das multas impostas pelas repartições de estatistica ou pelas commissões censitarias haverá recurso para o Ministro do Interior na Capital Federal e para os Governadores nos Estados.

Art. 20. Evitar-se-ha movimento de guarnições e forças aquarteladas ou embarcadas e em geral do pessoal administrativo de qualquer categoria, não só no dia 31 de dezembro como em um periodo em que possa prejudicar o recenseamento decretado, para o que o Ministro do Interior requisitará das autoridades competentes a expedição das necessarias ordens.

Art. 21. Nos casos em que, por motivo de nascimento, casamento, obito, viagem ou qualquer outro facto superveniente, haja duvida quanto á inclusão ou exclusão de algum individuo nos boletins, regulará a situação ou estado em que esse individuo se achar na meia-noite de 31 de dezembro para 1º de janeiro.

Rio de Janeiro, 12 de agosto de 1890. - José Cesario de Faria Alvim.

CLBR Vol. 08 Ano 1890 Págs. 1852 a 1857 Tabelas (MODELOS)