DECRETO N. 343 – DE 23 DE MAIO DE 1891
Concede á Companhia Frigorifica e Pastoril Brazileira autorização para funccionar.
O Presidente da Republica dos Estados Unidos do Brazil, attendendo ao que requereu a Companhia Frigorifica e Pastoril Brazileira, devidamente representada, resolve conceder-lhe autorização para funccionar com os estatutos que apresentou e mediante o cumprimento prévio das formalidades exigidas pela legislação em vigor.
O Ministro de Estado dos Negocios da Agricultura, Commercio e Obras Publicas assim o faça executar.
Capital Federal, 23 de maio de 1891, 3º da Republica.
MANOEL DEODORO DA FONSECA.
Barão de Lucena.
Estatutos da Companhia Frigorifica e Pastoril Brazileira, a que se refere o decreto n. 343 de 23 de maio de 1891
CAPITULO I
DA CONSTITUIÇÃO, SÉDE E DURAÇÃO DA COMPANHIA
Art. 1º Fica constituida sob a denominação de Companhia Frigorifica e Pastoril Brazileira uma sociedade anonyma, que se regerá por estes estatutos e pela legislação em vigor.
Art. 2º A séde da companhia e o seu fôro juridico é a Capital da Republica dos Estados Unidos do Brazil, cidade do Rio de Janeiro.
Paragrapho unico. A companhia poderá ter succursaes ou agencias, no paiz e no estrangeiro, ficando a directoria autorizada para fundal-as.
Art. 3º O prazo da duração da companhia é de 50 annos, contados da data de sua installação.
§ 1º O dito prazo poderá ser prorogado por deliberação da assembléa geral dos accionistas, para esse fim expressamente convocada.
§ 2º Antes da expiração do prazo marcado a companhia só poderá ser dissolvida nos casos previstos na lei ou por perdas que importem em mais de metade do capital.
Art. 4º Dissolvida a companhia, a liquidação se effectuará de accordo com a resolução da assembléa geral dos accionistas e com o direito vigente.
CAPITULO II
DO FUNDO SOCIAL, ACÇÕES E ACCIONISTAS
Art. 5º O capital da companhia é de sessenta mil contos de réis (60.000:000$000) dividido em 300.000 acções do valor nominal de duzentos mil réis (200$000) cada uma.
Art. 6º Os accionistas realizarão uma unica prestação de capital, de 30 % ou 60$ por acção, com a qual as acções consideram-se integradas para todos os effeitos, distribuindo-se desde logo os titulos definitivos das acções, as quaes poderão ser nominativas ou ao portador.
Paragrapho unico. Para a realização dos serviços a que se propõe, a companhia emittirá obrigações ao portador (debentures) até ao valor do seu capital.
Art. 7º As acções nominativas poderão ser convertidas ao portador e vice-versa, mediante proposta assignada pelo accionista ou procurador legitimo, com poderes especiaes.
Paragrapho unico. Pela conversão os accionistas pagarão uma taxa que será fixada pela directoria.
Art. 8º A transferencia das acções nominativas faz-se por termo lavrado nos livros de registro da companhia, assignado pelo cedente e pelo cessionario; a das acções ao portador, pela simples tradição.
Paragrapho unico. O accionista (cujas acções forem nominativas) que tiver caucionado as sua acções, não fica por isso inhibido de exercer os seus direitos nem de receber dividendos, excepto quando o contrario for expressamente declarado por escripto. Das acções ao portador presume-se proprietario quem apresentar os respectivos titulos e a esse compete exercer todos os direitos.
CAPITULO III
DAS OPERAÇÕES DA COMPANHIA
Art. 9º A companhia tem por fim explorar, auxiliar e desenvolver, em sua plenitude e de modo geral, em todo o territorio da Republica e, nomeadamente, nos Estados do Pará, Piauhy, Minas Geraes, S. Paulo, Paraná e Rio Grande do Sul, a industria pastoril em todas as suas ramificações e todas as industrias connexas, inclusive a do transporte de carnes conservadas, em vapores e vagões frigorificos.
Art. 10. A companhia estabelecerá, onde convier, grandes fazendas de criação e engorda de gado, introduzindo nellas todos os melhoramentos scientificos modernos e os typos novos que forem necessarios para o aperfeiçoamento das raças vaccum, cavallar, muar, lanigera e outras; fundará as fabricas que julgar convenientes para o aproveitamento de todos os derivados da industria pastoril; e mandará construir, por sua conta, vapores e carros frigorificos apropriados ao transporte das carnes e outros productos; podendo, igualmente, receber gado á commissão, fundar hospedarias para os boiadeiros e seus auxiliares, e, finalmente, operar e realizar tudo quanto possa concorrer directa ou indirectamente para os seus intuitos.
Art. 11. Além dos fins principaes a que se referem os artigos precedentes, e sem prejuizo desses, a companhia poderá ainda explorar qualquer industria agricola ou extractiva que convenha ao aproveitamento dos terrenos que possuir; adquirir e explorar propriedades agricolas; adquirir terrenos urbanos ou suburbanos para revender; promover a edificação de casas apropriadas a habitações das classes pobres e alugar ou vender essas casas, podendo, neste caso, facilitar o pagamento em prestações, segundo tabellas que organizará; contractar com os Governos Federal ou dos Estados a introducção e collocação de immigrantes; dividir terrenos em lotes para vender na fórma da lei aos mesmos immigrantes; e, finalmente, fazer outras quaesquer operações industriaes e mercantis, como sejam subscrever acções e outros titulos de emprezas nacionaes ou estrangeiras, emprestimos geraes dos Estados ou municipaes, e effectuar, com as precisas garantias, as operações bancarias que julgue convenientes, especialmente tendo por fim facilitar o desenvolvimento industrial do paiz.
Art. 12 Para execução do vasto plano da companhia a directoria fica autorizada a requerer aos poderes competentes, e na fórma da lei, as terras devolutas que julgue convenientes e os favores que a lei conceder; a fazer quaesquer contractos com os Governos Federal e dos Estados; a adquirir quaesquer concessões, contractos ou privilegios, assumindo a obrigação de executar taes contractos em toda a sua comprehensão, vantagens, resultados, onus e obrigações; e, finalmente, a adquirir as propriedades que julgar convenientes.
Art. 13. A directoria fica igualmente autorizada a fazer todas as operações de credito que forem necessarias á realização dos fins da companhia e, nomeadamente, a contractar e realizar um emprestimo por meio de obrigações ao portador (debentures) até ao valor do capital social, conforme o disposto no art. 6º, paragrapho unico.
Art. 14. Os dinheiros da companhia serão recolhidos a um ou mais bancos com os quaes ella mantenha conta corrente para o necessario movimento de fundos, cabendo á directoria, não só a escolha desses estabelecimentos, como regular o modo pratico de realizar-se o movimento de fundos entre as succursaes ou agencias nos Estados e a séde da companhia, devendo preferir, sempre que seja possivel, a mediação bancaria.
CAPITULO IV
DA ADMINISTRAÇÃO DA COMPANHIA
Art. 15. A companhia será administrada por uma directoria composta de quatorze directores, eleita, com excepção da primeira que é nomeada nestes estatutos, pela assembléa geral dos accionistas; e terá um superintendente geral nomeado pela directoria, com excepção tambem do primeiro, igualmente aqui nomeado.
Art. 16. O mandato da directoria durará seis annos e tem a plenitude e integridade juridica de poderes, inclusive os em causa propria, e de transigir, contractar, alienar e onerar.
Paragrapho unico. Findo o prazo do mandato, os directores podem ser reeleitos; o superintendente servirá emquanto desempenhar bem os seus deveres, a juizo da directoria.
Art. 17. Os directores elegerão de entre si, por maioria de votos, o presidente, o vice-presidente e o secretario, que deverão residir na séde da companhia.
Paragrapho unico. Os outros directores poderão residir nos Estados onde a companhia tem de exercer a sua actividade e, nesse caso, assumirão a direcção dos negocios e serão os legitimos representantes da companhia nas respectivas zonas, subordinando sempre seus actos ás deliberações da directoria tomadas na séde social.
Art. 18. A directoria delibera por maioria de votos dos directores presentes na séde da companhia, comtanto que não sejam menos de tres, inclusive o presidente. O vice-presidente substitue o presidente e o secretario o vice-presidente.
§ 1º Em caso de empate, o presidente ou quem suas vezes fizer terá voto de qualidade.
§ 2º Aos directores residentes nos Estados compete o direito de, quando o julgarem necessario e achando-se na séde social, solicitar a reunião da directoria para propôr o que julgarem conveniente e tomarem conhecimento dos negocios da companhia.
Art. 19. Além do superintendente geral a directoria nomeará os prepostos que julgar necessarios, marcando-lhes as attribuições, os vencimentos e as fianças.
Art. 20. O presidente terá o vencimento annual de dezoito contos de réis e os directores o de doze contos. O superintendente geral terá o vencimento, tambem annual, de dezoito contos de réis. Estes vencimentos serão pagos mensalmente.
Paragrapho unico. Além dos vencimentos fixos aqui estipulados caberá mais á administração a porcentagem de 2 1/2 % (dous e meio por cento) dos lucros liquidos, a qual será dividida igualmente entre os membros da directoria e o superintendente geral.
Art. 21. Só poderão ser eleitos para os cargos da directoria, accionistas que possuirem, pelo menos, 200 acções da companhia, livres de qualquer onus; e antes de entrar em exercicio cada um é obrigado a garantir a responsabilidade de sua gestão com a caução de 200 acções, que ficarão inalienaveis emquanto exercer o cargo e não forem approvadas as respectivas contas, entendendo-se que renuncia o cargo o accionista eleito que não realizar a referida caução dentro do prazo de trinta dias.
Art. 23. Não poderão servir conjunctamente na directoria ascendentes e descendentes ou seus affins, irmãos e cunhados durante o cunhadio.
Art. 23. O director que por espaço de seis mezes deixar de exercer o cargo, entende-se que o tem resignado, salvo quando mesmo ausente, dentro ou fóra do paiz, prestar serviços á companhia, ou impedimento temporario préviamente communicado á directoria.
Art. 24. No caso de vaga de algum logar de director, os outros designarão um accionista para preenchel-a até á primeira reunião da assembléa geral ordinaria, na qual se procederá á nomeação definitiva.
Paragrapho unico. O substituto eleito exercerá o cargo pelo tempo que faltar para terminar o mandato do substituido, e é sujeito ás disposições do art. 21.
Art. 25. A directoria tem poderes amplos e illimitados de administração, cabendo-lhe a livre escolha, nomeação, suspensão e demissão dos seus prepostos, auxiliares ou quaesquer empregados, constituir mandatarios revogaveis, no fôro e fóra delle; celebrar contractos de que provenham vantagens, direitos ou obrigações para a companhia; resolver sobre a acquisição e venda de propriedades, privilegios, concessões ou direitos, demandar ou ser demandada, podendo transigir como melhor entender no interesse da companhia; resolver sobre os dividendos a distribuir e, finalmente, praticar todos os actos de administração sem nenhuma restricção.
§ 1º O presidente é o orgão da administração e representante da companhia, nas suas relações externas, e como tal lhe compete:
Executar e fazer executar as deliberações da directoria e assembléas geraes;
Convocar e presidir as assembléas geraes e as reuniões da directoria;
Assignar com o director-secretario e outro director as responsabilidades da companhia, e com o guarda-livros os balancetes ou balanços que hajam de ser publicados;
Organizar o relatorio annual e apresental-o á assembléa geral.
§ 2º Ao secretario compete lavrar as actas das reuniões da directoria, dirigir ao escriptorio central e assignar a correspondencia da companhia.
Art. 26. Conforme o disposto no art. 15 destes estatutos, ficam nomeados para servirem no primeiro periodo de seis annos os seguintes senhores:
Conselheiro Ruy Barbosa, presidente.
Conselheiro Francisco de Paula Mayrink, vice-presidente.
Dr. Theodoreto Carlos de Faria Souto, secretario.
Directores
Conselheiro Barão do Alto-Mearim.
Dr. Oscar Varady.
Commendador José Duarte Rodrigues.
Conselheiro Jesuino Marcondes de Oliveira e Sá.
Dr. Nelson de Vasconcellos.
Emilio A. de Castro Martins.
Dr. Evaristo Gonçalves Machado.
Joaquim de Mattos Faro.
Capitão de mar e guerra Frederico Guilherme Lorena.
Capitão-tenente Ernesto do Prado Seixas.
Conselheiro Henrique Francisco de Avila.
E superintendente geral, o Sr. commendador Antonio Pereira Cardoso.
CAPITULO V
DO CONSELHO FISCAL
Art. 27. O conselho fiscal compor-se-ha de sete membros effectivos e cinco supplentes; e será, com excepção do primeiro que é tambem nomeado nestes estatutos, eleito annualmente pela assembléa geral ordinaria, por maioria de votos, e decidindo a sorte no caso de empate.
§ 1º Para ser eleito membro do conselho fiscal ou supplente é necessario ser accionista e possuir pelo menos cem acções da companhia, inscriptas em seu nome.
§ 2º Aos supplentes compete substituir os effectivos nos seus impedimentos ou no caso de vaga; cabendo á directoria designar o que deve ser chamado.
Art. 28. O mandato do conselho fiscal tem a plenitude que lhe confere a lei e durará um anno, isto é, o intervallo entre duas assembléas geraes ordinarias.
§ 1º O conselho fiscal poderá ser ouvido sobre os negocios da companhia, todas as vezes que a directoria julgar conveniente.
§ 2º Os membros effectivos do conselho fiscal serão remunerados com o vencimento annual de 6:000$, pago mensalmente.
Art. 29. Ficam nomeados para comporem o primeiro conselho fiscal os seguintes Srs. accionistas:
Dr. Ludgero Antonio Coelho.
Commendador Luiz de Faro Oliveira.
Dr. Joaquim José de Oliveira Andrade.
Dr. Manoel Rodrigues Monteiro de Azevedo.
Dr. Manoel Rodrigues de Figueiredo.
Dr. João Pires Farinha.
Commendador Giovani Scarzanella.
E para supplentes, os Srs.:
Conselheiro João da Matta Machado.
Commendador Alfredo Montanha Martins de Pinho.
Commendador Manoel Teixeira da Silva Cotta.
José Joaquim Peres da Silva.
José Maria da Cunha Vasco.
CAPITULO VI
DA ASSEMBLÉA GERAL
Art. 30. Na constituição das assembléas geraes serão observadas as disposições legaes e mais o seguinte:
O presidente da directoria será o presidente das reuniões e convidará dous accionistas para secretarios;
Cada dez acções dão direito a um voto e assim successivamente sem limite algum, cabendo a cada accionista tantos votos quantos forem os grupos de 10 acções que possuir;
Os accionistas podem fazer-se representar por procuradores bastantes, tambem accionistas, comtanto que não sejam directores ou fiscaes;
Os possuidores de acções ao portador deverão, para poderem tomar parte nas assembléas geraes, depositar as suas acções no escriptorio da companhia até 31 de dezembro, quando se tratar de assembléa ordinaria, e cinco dias antes do da reunião, quando se tratar de assembléa extraordinaria.
Os menores ou interdictos serão representados por seus paes, tutores ou curadores, as mulheres casadas por seus maridos, as heranças indivisas pelos inventariantes, as firmas sociaes por um dos socios ou representantes e em geral as corporações ou pessoas juridicas por seus administradores ou prepostos.
Art. 31. A reunião ordinaria da assembléa geral terá logar todos os annos na séde social, no mez de março.
Extraordinariamente haverá tantas reuniões quantas a directoria julgar necessarias ou forem legalmente requeridas, não podendo, nessas reuniões, ser discutido ou votado objecto estranho ao motivo da convocação.
A convocação das assembléas geraes será feita por annuncio com 15 dias de antecedencia.
A directoria póde, quando entender necessario, reduzir este prazo a oito dias.
Art. 32. As votações para eleição serão sempre por escrutinio secreto. As outras poderão ser symbolicas, salvo reclamação da mesa ou de algum accionista, em cujo caso serão igualmente por escrutinio secreto.
CAPITULO VII
DOS DIVIDENDOS E DO FUNDO DE RESERVA
Art. 33. A companhia terá um fundo de reserva formado pela quota de 5 % retirados dos lucros liquidos semestraes.
Cessará a formação deste fundo quando sua importancia attingir a um terço do capital realizado da companhia.
Art. 34. Feitas as deducções estabelecidas nestes estatutos, o saldo dos lucros liquidos será distribuido em dividendos aos accionistas até 10 %. Do excesso retirar-se-hão 50 % para os promotores da companhia, Srs. conselheiros Francisco de Paula Mayrink, conselheiro Barão do Alto-Mearim, Dr. Theodoreto Carlos de Faria Souto, commendador Luiz de Faro Oliveira, commendador José Duarte Rodrigues, Dr. Nelson de Vasconcellos e Eugenio de Andrade, divididos em partes iguaes, com direito á transmissão e cessão inter-vivos e herdeiros post-mortem. O saldo será distribuido pelos accionistas até completar 12 % ao anno, levando-se o que exceder á conta de lucros suspensos.
CAPITULO VIII
DISPOSIÇÕES TRANSITORIAS
Art. 35. A directoria fica desde já autorizada a pagar as despezas da organização da companhia.
Art. 36. Todos os casos omissos nestes estatutos serão regulados pela lei que reger as sociedades anonymas.
Rio de Janeiro, 10 de abril de 1891. – Theodoreto Carlos de Faria Souto, director-secretario.