DECRETO N

DECRETO N. 217 – DE 2 DE MAIO DE 1891

Concede á Companhia Antarctica Paulista autorização para funccionar.

O Presidente da Republica dos Estados Unidos do Brazil, attendendo ao que requereu a Companhia Antarctica Paulista, devidamente representada, resolve conceder-lhe autorização para funccionar, com os estatutos que apresentou e mediante o cumprimento prévio das formalidades exigidas pela legislação em vigor.

O Ministro de Estado dos Negocios da Agricultura, Commercio e Obras Publicas assim o faça executar.

Capital Federal, 2 de maio de 1891, 3º da Republica.

MANOEL Deodoro DA Fonseca.

Barão de Lucena.

Estatutos da Companhia Antarctica Paulista a que se refere o decreto n. 217 de 2 de maio de 1891

CAPITULO I

ORGANIZAÇÃO, SÉDE, OPERAÇÕES E DURAÇÃO

Art. 1º Fica constituida a sociedade anonyma denominada Companhia Antarctica Paulista, a qual será regida pelo decreto n. 164, de 17 de janeiro de 1890, na parte que for applicavel, e bem assim pelas disposições dos presentes estatutos, tendo séde e fóro na cidade de S. Paulo, capital do Estado do mesmo nome. (Brazil.)

Art. 2º A companhia tem por fins:

1º Explorar a fabrica da cerveja Antarctica Paulista e desenvolvel-a no sentido de alargar a producção, de accordo com a procura e acceitação desse producto;

2º Fabricar o acido carbonico liquido, com applicação á cerveja e outras bebidas espumantes;

3º Fabricar o maltz (cevada germinada), pelo systema mais aperfeiçoado;

4º Promover a cultura de cevada e applicar os residuos da mesma á engorda e criação de porcos;

5º Adquirir a grande chacara onde se acha estabelecido actualmente o Club Germania, em frente ao Mercadinho, á rua de S. João, e estabelecer-se ahi:

a) Machina de gelo destinada a:

1º Secção de engarrafamento;

2º Producção de gelo para o abastecimento da cidade;

3º Manutenção de camaras frias para a conservação, mediante armazenagem, de generos de facil deterioração como frutas, legumes, leite, peixe, etc.;

b) Deposito de materia prima e dos productos das fabricas da companhia;

c) No espaço occupado actualmente pelo gradil, na rua de S. João, pequenos chalets, confortaveis e hygienicos, annexos ás camaras frias, para a venda do leite, peixe, frutas, caça, etc.;

d) Grande salão e jardim de recreio para a venda de chops.

6º Fundar na Agua Branca uma usina de distillação, rectificação de alcool e outras manipulações;

7º Montar na localidade do Estado, actualmente servida por estrada de ferro (Botucatú, Itapetininga ou Jahú), que for julgada mais conveniente, uma fabrica de banhas, presuntos, salames, carnes ensaccadas, etc., aproveitando para isso todos os apparelhos da antiga fabrica daquelles productos, pertencentes á Antarctica Paulista, os quaes se acham desmontados e em perfeito estado de conservação.

Para esse fim a companhia adquirirá terrenos apropriados para a criação e engorda de porcos e que disponham de quéda de agua para a installação da fabrica;

8º Edificar por conta propria ou dividir em lotes e vender os terrenos de sua propriedade, annexos á Fabrica Antarctica e os da Chacara Germania, desnecessarios ás necessidades da companhia;

9º Montar opportunamente no norte da Republica (Bahia ou Pernambuco), uma fabrica de cerveja modelada pela Antarctica Paulista, estabelecendo alli uma delegação da directoria;

10. Promover e realizar, por conta propria ou de terceiros, emprehendimentos que entendam com o progresso industrial e agricola.

Art. 3º O prazo da duração da companhia será de 30 annos, a contar da data da installação. Antes desse prazo a companhia não poderá ser dissolvida, sinão nos casos previstos pela lei.

CAPITULO II

CAPITAL E ACÇÕES

Art. 4º O capital da companhia será de tres mil contos de réis (3.000:000$), dividido em quinze mil acções de duzentos mil réis (200$) cada uma, podendo ser elevado mediante deliberação da assembléa geral.

No augmento de capital os accionistas terão preferencia á subscripção das novas acções, na proporção das que possuirem ao tempo da emissão.

Art. 5º O capital será realizado em prestações, devendo a primeira de 30 % ter logar no acto da assignatura dos presentes estatutos e as demais de 10 %, de accordo com as necessidades da companhia, a juizo da directoria, com intervallos nunca menores de 30 dias, até completar 65% do valor de cada acção; os 35 % restantes serão realizados com o excedente da venda liquida sobre o dividendo, fundo de reserva, etc., na fórma do art. 31 dos presentes estatutos.

Uma vez realizados os 65 % de entradas, o accionista receberá um titulo ou obrigação correspondente a cada acção, e della inseparavel, do valor de 70$, vencendo o juro annual de 5%, pago conjunctamente com os dividendos, o qual será substituido pela acção respectiva logo que o capital seja integralizado pelo excedente da renda liquida, na fórma do acima referido.

Paragrapho unico. E’ licito no accionista fazer antecipadamente as entradas até 65%, recebendo o que o fizer desde logo o titulo ou obrigação, relativo aos 35% restantes.

Art. 6º A directoria poderá declarar em commisso as acções, cujas entradas forem demoradas por mais de 30 dias, contados da data do vencimento das repectivas chamadas. As acções declaradas em commisso serão reemittidas e as suas importancias levadas ao fundo de reserva.

Art. 7º As transferencias das acções serão feitas por termo, em livro especial assignado pelo cedente e cessionario, ou por seus legitimos procuradores, com poderes necessarios.

Art. 8° Cinco acções dão direito a um voto e cada accionista poderá ter até 40 votos, não entrando nesse numero os que representar como procurador.

CAPITULO III

DA DIRECTORIA E SUAS OBRIGAÇÕES

Art. 9º A companhia será administrada por uma directoria composta de tres membros – presidente, secretario e gerente, eleitos pela assembléa geral de accionistas, e poderá ser reeleita em toda ou parte.

Paragrapho unico. O mandato da directoria durará cinco annos.

Art. 10. Só poderá exercer o cargo de director o accionista que possuir pelo menos cincoenta acções.

Art. 11. As acções mencionadas no artigo antecedente considerar-se-hão inalienaveis durante o tempo da gestão do cargo de director, até serem approvadas as contas de sua gerencia de director, e ficarão depositadas no cofre da companhia.

Art. 12. Não poderão exercer conjunctamente o cargo de director os parentes até segundo gráo e os membros da mesma firma social.

Art. 13. Nenhum membro da directoria poderá deixar de exercer as funcções de seu cargo, por mais de 60 dias, sem causa justificada; dado esse caso, entender-se-ha que renunciou o logar.

Art. 14. Na vaga do logar de director, os restantes chamarão um accionista que preencha as condições do art. 10, para substituil-o até á reunião da primeira assembléa geral, que deverá fazer a eleição effectiva.

Art. 15. O director nomeado em substituição exercerá o cargo pelo tempo que faltar para conclusão do mandato da directoria em exercicio.

Art. 16. A’ directoria compete:

§ 1º Exercer a administração geral de todos os serviços da companhia.

§ 2º Nomear e demittir os superintendentes das fabricas, os agentes commerciaes, os mestres das officinas ou fabricas, e os demais empregados, marcar-lhes os ordenados ou firmar contractos, mediante porcentagem nos lucros liquidos das fabricas, si assim for conveniente aos interesses da companhia.

§ 3° Organizar os regulamentos das fabricas, marcando as obrigações dos superintendentes.

Art. 17. A directoria fica revestida dos poderes necessarios para praticar todos os actos de gestão e para representar a companhia em juizo ou fóra delle em todas as questões que a ella interessem, podendo transigir, celebrar contractos, contrahir emprestimos por meio de obrigações ao portador (debentures), e fazer quaesquer outras operações de credito, adquirir, hypothecar e alienar bens, adquirir e transferir direitos e privilegios, dispondo e determinando todos os serviços e operações com plenos, geraes e especiaes poderes. (Art. 10, § 1°, n. 2, do decreto n. 164 de 17 de janeiro de 1891.)

Art. 18. Os directores perceberão o vencimento annual de 600$, pagos mensalmente. O director-gerente terá mais a gratificação mensal de 200$000.

Art. 19. Ao director-presidente compete:

a) Velar pela fiel observancia destes estatutos;

b) Presidir as sessões da directoria e regular seus trabalhos;

c) Convocar extraordinariamente a directoria, sempre que julgar conveniente, e determinar, de accordo com os outros directores, os dias das sessões da directoria;

d) Apresentar á assembléa geral ordinaria dos accionistas, em nome da directoria, o relatorio annual das operações do estado da companhia;

e) Assignar as procurações para qualquer mandato da directoria;

f) Representar a companhia em suas relações com terceiros ou em juizo, sendo-lhe facultado para isso constituir mandatarios;

g) Assignar os balancetes que forem publicados;

h) Procurar ultimar por meios amigaveis ou em juizo arbitral as contestações que se possam suscitar entre a companhia e seus devedores ou terceiros, ouvida a directoria.

Art. 20. Ao director-secretario:

a) Substituir o director-presidente nas suas faltas ou impedimentos;

b) Officiar, quando for necessario, ao conselho fiscal, assistir aos exames que o mesmo conselho tenha de fazer e fornecer-lhe todos os documentos e informações que lhe forem pedidos.

Art. 21. Ao director-gerente compete:

a) Exercer especial fiscalização sobre todo o movimento das fabricas, armazens e escriptorios;

b) Assignar todos os papeis do expediente;

c) Dirigir a contabilidade da companhia.

Art. 22. A directoria se reunirá, pelo menos, duas vezes por mez.

Art. 23. E’ válida a deliberação da directoria que tiver sido approvada por dous votos concordes.

CAPITULO IV

DO CONSELHO FISCAL

Art. 24. O conselho fiscal será composto de tres supplentes eleitos annualmente pela assembléa geral ordinaria, de entre os accionistas que possuirem pelo menos vinte acções.

Paragrapho unico. Cada membro do conselho fiscal perceberá a gratificação de 100$, pagos mensalmente.

Art. 25. Aos membros do conselho compete:

a) Examinar e fiscalizar a escripturação e actos da directoria, velando pelo restricto cumprimento dos estatutos e as disposições do decreto n. 164 de 16 de janeiro de 1890.

b) Dar parecer sobre o relatorio, contas annuaes que lhe apresentar a directoria, e, bem assim, sobre os assumptos em que for por ella consultado, tanto nos casos previstos pelos estatutos, como nos omissos.

CAPITULO V

DA ASSEMBLÉA GERAL

Art. 26. Constitue assembléa geral a presença dos accionistas em numero que represente, pelo menos, a quarta parte do capital social, tendo suas acções inscriptas no registro da companhia, com antecedencia de 30 dias, pelo menos.

Art. 27. A reunião ordinaria terá logar no mez de março de cada anno e as extraordinarias sempre que forem necessarias, devendo, tanto em um como em outro caso, ser annunciada com antecedencia de 15 dias.

Art. 28. A’ assembléa geral ordinaria compete:

a) Resolver sobre todos os negocios que interessarem á companhia;

b) Eleger a directoria e conselho fiscal, e tomar contas de sua administração.

Art. 29. Si na primeira e segunda convocação não houver numero legal de accionistas, se convocará terceira reunião, que deliberará com qualquer numero.

CAPITULO VI

DO FUNDO DA RESERVA E DIVIDENDO

Art. 30. O fundo de reserva será formado da porcentagem de 5 % tirados dos lucros liquidos de cada semestre.

Art. 31. O fundo de reserva é destinado a refazer o capital social e será empregado em titulos que offeregam solida garantia.

Os juros desses titulos terão a mesma applicação.

Art. 32. Dos lucros liquidos provenientes das operações efectuadas em cada semestre e depois de feita a deducção de que trata o art. 29, serão deduzidos mais cinco por cento que serão levados a uma conta especial de depreciação de material e do restante se fará dividendo até 15 por cento do capital realizado.

Paragrapho unico. O lucro liquido excelente será levado á conta de capital para a integralização das acções, na fórma do art. 5º dos presentes estatutos.

Art. 33. Uma vez que o fundo de reserva attingir a cincoenta por cento do capital, deixará de ser feita dos lucros liquidos a deducção estipulada no art. 29.

Art. 34. O anno financeiro da companhia conta-se de 1 de janeiro a 31 de dezembro.

O primeiro exercicio conta-se da data da installação a 31 de dezembro de 1891.

CAPITULO VII

DISPOSIÇÕES TRANSITORIAS

Art. 35. Fica a primeira directoria autorizada a adquirir por compra, terrenos, propriedades, contractos, concessões, etc., que forem necessarios ou de vantagem para a realização dos fins da companhia; bem como fazer aquisição do material necessario ás demais industrias que explorar, podendo, si julgar conveniente, adquirir estabelecimentos já existentes.

Fica a directoria autorizada a requerer ao Governo Federal a approvação dos presentes estatutos e acceitar as modificações que o mesmo julgar conveniente.

Art. 36. A primeira directoria ficará composta dos accionistas:

Dr. Augusto da Rocha Miranda, presidente.

Dr. Fabio Ramos, secretario.

Asdrubal Augusto do Nascimento, gerente.

Art. 37. O conselho fiscal; que terá de servir no primeiro anno, se comporá dos seguintes accionistas:

Antonio Zeremmer.

Dr. Paulo Ferreira Alves.

Dr. Augusto de Siqueira Cardoso.

Supplentes

Manoel Dupré.

Dr. José Bernardo Gomes Guimarães.

Dr. Manoel Aureliano Gusmão.

S. Paulo, 9 de fevereiro de 1891. (Seguem-se as assignaturas.)