DECRETO - DE 29 DE DEZEMBRO DE 1829

Declara sem effeito o Decreto de 14 de Novembro ultimo e da nova organização ao Commissariado do Exercito.

Sendo indispensavel remover os abusos, e diminuir quanto possivel fôr as despezas, que em tempo de paz se fazem pela Repartição do Commissariado, mandada estabelecer por Decreto de vinte e dous de Fevereiro de mil oitocentos e vinte, e não podendo ter execução o Decreto de quatorze de Novembro do corrente anno, que manda extinguir aquella Repartição, creando um systema novo, que, além de mais despendioso, apresenta inconvenientes graves, e dignos de prompto remédio: Hei por bem Ordenar que fique de nenhum effeito o mencionado Decreto de quatorze de Novembro, assim como as Instrucções, que com elle baixaram, na mesma data; devendo em consequencia a Repartição do Commissariado ser reduzida, em tempo de paz, unicamente á fiscalisação, e contabilidade do fornecimento dos viveres do Exercito, o qual será posto em arrematação, na conformidade das Instrucções, que com este baixam, assignadas pelo Conde do Rio Pardo, do Meu Conselho, Ministro e Secretario de Estado dos Negocios da Guerra, que assim o tenha entendido e faça executar com os despachos necessarios. - Paço em vinte e nove de Dezembro de mil oitocentos vinte e nove, oitavo da Independencia e do Imperio.

Com a rubrica de Sua Magestade Imperial.

Conde do Rio Pardo.

Instrucções para regular o modo, por que se deve fazer o fornecimento dos vivereS do Exercito sendo posto em arrematação; na conformidade do Decreto desta data

SECÇÃO 1ª

Art. 1º A repartição do Commissariado ficará reduzida, em tempo de paz, unicamente á contabilidade, e fiscalisação do fornecimento da tropa, o qual será feito por arrematação, pela maneira adiante declarada: sendo pela dita repartição do Commissariado que o Governo ordenará o que convier relativo a tal objecto.

Art. 2º Receberá com tudo o dinheiro necessário para o pagamento dos empregados na repartição, para ajustes de contas, forragens a dinheiro, e despezas miudas, legalmente autorizadas:

Art. 3º Até o dia 15 de cada mez, apresentará ao Thesouro Publico na Côrte, e ás Juntas de Fazenda nas provincias, o orçamento da despeza geral do mez seguinte.

Art. 4º Da Thesouraria Geral das Tropas na Côrte, e das respectivas Pagadorias nas provincias, se remetterá ao empregado do Commissariado, até o dia 5 de cada mez, um extracto das relações de mostra do mez antecedente, a fim de nesta Estação se poder legalisar o numero das rações fornecidas.

Art. 5º Ficam derogados todos os artigos do regulamento do Commissariado, que estavam em pratica, concernentes a ajustes, compras e distribuições dos generos, o que passa a ser privativo dos arrematantes do fornecimento.

Art. 6º Continuam porém no seu inteiro vigor os artigos do mesmo regulamento, que se referem ao systema de fisealisação, e contabilidade.

Art. 7º Os empregados do Commissariado, que segundo a presente reducção não se tornarem necessarios nesta repartição, poderão ser empregados em alguma outra, segundo a sua aptidão.

Art. 8º Aquelles, porém, que ficarem sem exercicio por desnecessarios, continuarão a perceber os seus respectivos ordenados, emquanto não forem convenientemente empregados.

Art. 9º Ficarão em todo o seu vigor os artigos do regulamento do Commissariado, relativos ás promoções, e demissões dos empregados desta repartição, emquanto um systema geral não fôr estabelecido a tal respeito.

SECÇÃO 2ª

MODO DE SE FAZER A ARREMATAÇÃO, E CONDIÇÕES, QUE SE DEVEM OBSERVAR

Art. 1º A arrematação será feita sobre rações de farinha, etapa, forragens, e luzes para quarteis, e durará por tempo de um anno, findando o primeiro em 31 de Dezembro de 1830.

Art. 2º Os generos, e as quantidades, de que se compõe cada uma destas rações, serão, na conformidade da Lei de 24 de Setembro de 1828, como consta da tabella transcripta no fim destas Instrucções; e pelo que respeita a forragens, e luzes para quarteis, e fortalezas, que alli não vem designadas, continuarão a fornecer-se as mesmas quantidades, que estão em pratica na repartição do Commissariado, e que vão declaradas em seguimento da sobredita tabella.

Art. 3º O fornecimento será arrematado junto, ou separadamente, excepto os generos de que se compõem as etapas, que farão objecto de uma só arrematação, e destes o artigo carne verde, que tambem poderá ser arrematado sobre si: em todo o caso o fornecimento deste artigo, na Côrte, não terá principio senão do 1º de Julho de 1830 em diante, por se achar arrematado até fim de Junho do mesmo anno.

Art. 4º A arrematação poderá ser geral, ou parcial, por um determinado numero de rações, que nunca será menor que o necessario para a força de um batalhão no seu estado completo; com tanto que os arrematantes se obriguem ás alterações para mais, e para menos, que possam occorrer; e os interesses da Fazenda, combinados com o bem do serviço, decidiram o Governo a adoptar as condições mais vantajosas, que lhe forem propostas pelos fornecedores.

Art. 5º Havendo porém quem se proponha a fazer todo o fornecimento de rações, assim de pão, farinha, e etapa, como forragens, e luzes para quarteis, debaixo de uma mesma arrematação, terá a preferencia, se offerecer vantagens para a Fazenda, que não sejam inferiores ás dos concurrentes, que se propuzerem a fornecer em parte.

Art. 6º Os artigos antecedentes relativos ás épocas, e modo de se fazer o fornecimento, serão applicados á Côrte, e áquellas provincias, onde o dito fornecimento se faz pela repartição do Commissariado. Nas demais provincias porém ficarão subsistindo em todo o seu vigor os contractos, ajustes, ou mesmo arrematações existentes, até que uma medida geral seja adoptada.

Art. 7º Os arrematantes receberão os generos, e os utensilios, que existirem nos armazens do Commissariado, os primeiros por compra, e pelos preços correntes no mercado ao tempo da entrega, e os ultimos por inventario, para serem restituidos no fim da sua arrematação, no mesmo estado, em que os tiverem recebido.

Art. 8º Quando a arrematação se faça em geral, serão os arrematantes obrigados a fornecer toda a tropa, que existir nesta Côrte e provincia, embora o seu numero haja de augmentar por corpos que venham de fóra, ou diminuir por outros, que daqui destaquem. Entre os dous extremos será considerado o menor numero o de duas mil rações diarias de etapas, e o maximo de oito mil. Em ambos os casos precederão as convenientes participações para que os arrematantes possam regular as suas compras, segundo a força, a que tenham de fornecer.

Art. 9º Se a arrematação se realizar em parte, fica rão sujeitos os arrematantes á proporção de 2 a 8 marcado no artigo antecedente.

Art. 10. Os artigos relativos á arrematação feita na côrte terão lugar no que fôr applicavel ás arrematações feitas nas provincias designadas no art 6º.

Art. 11. O fornecimento será distribuido de dez em dez dias, nos armazens dos arrematantes, por corpos, ou companhias, segundo actualmente se pratica no Commissariado, com excepção de pão, que será de dous em dous dias, e a carne verde, e capim diariamente: a hora será marcada pela repartição competente.

Art. 12. As praças de pret, que por qualquer incidente se acharem separadas dos seus corpos, serão mandadas competentemente addir ao deposito, ou corpos, que existirem no lugar, onde tenham de ser fornecidas, a fim de que tal fornecimento se não faça individualmente.

Art. 13. Os arrematantes serão obrigados a dar conducção até ás portas dos respectivos quarteis aos generos, carne verde, secca, toucinho, milho, e capim.

Art. 14. Os individuos destinados para receber o fornecimento deverão apresentar-se com os utensilios necessarios, e munidos de um contra-vale passado na repartição do Commissariado, em que se declare o numero, e especies de rações, que tenham de receber: advertindo que as rações de etapa serão fornecidas mensalmente, segundo as circumstancias, na proporção de metade ou de um terço, entre os generos, carne verde e secca, arroz e feijão. Nas provincias serão estes generos regulados, segundo a abundancia do paiz, e o numero da tropa, a que se fornecer.

Art. 15. Os arrematantes estabelecerão os seus armazens nos lugares mais commodos á tropa, e terão em letras maiusculas sobre as portas - Fornecimento do Exercito. - Os corpos serão fornecidos em dias desencontrados, e que para esse fim se lhes marcar convenientemente; e para a conservação da boa ordem se prestará auxilio militar, se fôr necessario, durante a entrega das rações.

Art. 16. Os transportes por mar, ou por terra, empregados pelos arrematantes, serão protegidos pelas autoridades.

Art. 17 No fim de cada mez deverão os corpos achar-se completamente fornecidos dos seus vencimentos, de maneira que até o dia 5 do mez subsequente possam os arrematantes apresentar na repartição do Commissariado os contra-vales sommados, e relacionados por corpos, pelos quaes receberão da mesma repartição um conhecimento em fórma, para com elle haverem o seu pagamento no Thesouro Publico, ou nas Juntas da Fazenda.

Art. 18. O pagamento das forragens e mais vencimentos a dinheiro pertencentes aos Officiaes do Estado-Maior do Exercito, e aos dos Corpos, será realisado na repartição do commissariado no dia, que mensalmente se publicar, á vista das ordens, que áquella estação se expedirem a tal respeito.

Art. 19. Todos os generos serão de boa qualidade, e distribuidor por pesos e medidas aferidas pelo aferidor do Juizo; ficando expressamente prohibido o uso das balanças romanas, e das medidas que não forem chapeadas.

Art. 20. Os generos que se acharem incapazes, pela sua corrupção ou má qualidade, serão rejeitados, e os arrematantes fornecerão outros: no entanto poderão solicitar o recebimento delles, representando ao encarregado do Commissariado, o qual fará decidir a questão definitivamente por arbitros nomeados por uma e outra parte.

Art. 21. Os arrematantes não poderão fornecer rações a dinheiro á tropa, nem comprar-Ih'as, pena de lhas reporem novamente em especie, provada que seja esta abusiva transacção.

Art. 22. Nos ajustes porém de contas, que no fim de cada mez se fizer, na repartição do Commissariado, com os corpos, o valor da rações de etapas, que para liquidação das mesmas contas convenha serem pagas a dinheiro, será marcado pelo preço que se pagar aos arrematantes qualquer dos generos, de que ellas se compõe.

Art. 23. Os arrematantes serão obrigados a ter sempre em reserva os generos necessarios para o fornecimento, pelo menos de um mez da força que existir, a fim de acudir a qualquer falta imprevista, e occorrer ás necessidades de um embarque repentino de tropa, quando as circumstancias assim o exijam, e não poderão haver os seus pagamentos sem apresentarem um certificado do Commissariado, que atteste a existencia dos generos em reserva.

Art. 24. Havendo embarque de tropas, os arrematantes deverão promptificar os generos necessarios para o seu fornecimento, com a differença que os comprehendidos nas condições de seu contracto serão pagos pelo preço da arrematação, e os extraordinarios, como carne salgada, azeite doce, aguardente, bolacha, etc., pelos preços que apresentarem, que nunca excederão aos correntes no mercado, e o mesmo terá lugar a respeito do vinho, ou aguardente, que as tropas devem vencer quando se acharem em exercicios.

Art. 25. A despeza feita na conducção do fornecimento para bordo das embarcações de transporte será igualmente paga aos arrematantes pela Fazenda Publica á vista da sua conta legalisada no Commissariado.

Art. 26. O encarregado do Commissariado apresentará aos arrematantes uma relação deis generos, de que se deve compor o fornecimento, segundo as ordens que receber do Governo, ou dos Presidentes nas provincias, e com os recibos da entrega dos generos a bordo dos navios de transporte, acompanhados das contas e mais documentos de despezas pagas, haverão os arrematantes daquelle encarregado o conhecimento em fórma de toda a despeza, para com elle requererem o seu embolso.

Art. 27. Os arrematantes serão pagos indefectivelmente da importancia do fornecimento de cada mez até ao dia 15 do mez subsequente, mediante o conhecimento em fórma, e o certificado de que tratam os art. 17 e 23.

Art. 28. A arrematação será feita nesta Côrte perante a Junta do Arsenal do Exercito, e nas provincias perante as respectivas Juntas de Fazenda.

Art. 29. E' probibido expressamente a qualquer empregado publico o ser interessado nas arrematações do fornecimento, na conformidade do citado Regulamento, e das leis existentes.

Art. 30. Occorrendo alguma duvida na interpretação de qualquer das condições do contracto de arrematação, será decidido por arbitros, competentemente nomeados.

Tabela da Carta de Lei de 24 de Setembro de 1828: a que se refere o art. 2º Secção II

Farinha - 1/40 de alqueire.

Carne fresca - uma libra.

Arroz - quatro onças.

Toucinho - duas onças.

Sal - uma onça.

Lenha - vinte e quatro onças.

A ração de carne fresca de uma libra será substituida por meia de carne secca, e as quatro onças de arroz por 4/160 do alqueire de feijão.

A ração de vinho, ou aguardente, será fornecida sómente quando os corpos se acham em exercicios.

Forragem e luzes na conformidade do supracitado artigo

Para cada ração de forragem

Milho - 1/8 de alqueire, medida do Rio de Janeiro.

Capim - 2 4/ molhos, medida do caixão.

Para cada luz em um mez

Azeite - medida e meia.

Fio de algodão - duas onças.

N. B. A ração de vinho, ou aguardente, de que trata a tabella acima, continuará a ser como até aqui; a saber:

A de vinho de............1/8

De medida do Rio de Janeiro.

A de aguardente de.1/24

 

Paço em 29 de Dezembro de 1829. - Conde do Rio Pardo.