REGULAMENTO N. 124 - de 5 de Fevereiro de 1842

Contendo o Regimento provisorio do Conselho de Estado.

Hei por bem Ordenar que o Conselho de Estado Me consulte sobre os Regulamentos, de que trata o art. 8º da lei de sua creação, regendo-se entretanto pelas seguintes disposições.

TITULO UNICO

Como o Conselho de Estado exercerá as suas funcções

CAPITULO I

Do Conselho de Estado, e de suas secções

Art. 1º O Conselho de Estado será dividido em quatro secções:

1ª Dos Negocios do Imperio.

2ª Dos Negocios da Justiça, e dos Estrangeiros.

3ª Dos Negocios da Fazenda.

4ª Dos Negocias da Guerra, e Marinha.

Art. 2º Cada uma das secções se comporá de tres Conselheiros.

Art. 3º As secções, que se occuparem dos negocios de dous Ministerios, serão presididas pelo Ministro, a quem tocar o objecto, que nella se discutir.

Art. 4º Quando a importancia, e a complicação do; negocios o exigirem, poderão reunir-se duas, ou tres secções, sob a presidencia do Ministro, que pedir a reunião.

Art. 5º Os Ministros de Estado forneceráõ ás secções todos os esclarecimentos, que julgarem necessarios para acerto das deliberações.

Art. 6º O lugar, dia e hora das conferencias de cada secção, serão marcados pelos respectivos Ministros.

Art. 7º O Ministro Presidente da secção nomeará o Relator para cada negocio.

Art. 8º Discutida, e votada a materia, o Relator apresentará o parecer minutado, o qual, depois do approvado, será assignado na seguinte conferencia pelos membros da secção, que não derem voto separado.

O Ministro Presidente não votará, nem ainda no caso de empate.

Art. 9º O Imperador se Reserva o direito de resolver os pareceres das secções, sem que ouça ao Conselho reunido.

Art. 10. Os Avisos para consultas do Conselho de Estado, ou sejão estas sobre parecer de secções, ou sobre objectos, que ainda nestas não forão tratados, serão dirigidos em geral ás secções a que pertencerem os negocios, e estas colligiráõ, e ordenaráõ quanto puder esclarecer o Conselho em seus debates e decisão.

Art. 11. Quando o parecer da secção fór algum Projecto de Lei, Decreto, Regulamento, ou Instrucções, a secção respectiva lhe dará todo o preciso desenvolvimento, de maneira que o Conselho de Estado o possa regularmente discutir.

Art. 12. Para haver conferencia do Conselho de Estado sob a Presidencia do Imperador, é preciso que estejão presentes pelo menos sete Conselheiros de Estado em effectivo serviço.

Art. 13. As conferencias do Conselho de Estado terão lugar nos Paços lmperiaes, e quando o Imperador Houver por bem Convoca-lo.

Art. 14. Todas as vezes que fôr possivel, serão communicados com anticipação aos Conselheiros de Estado os objectos, para cuja consulta se reune o Conselho.

Art. 15. As disposições dos artigos antecedentes serão observadas, quando a urgencia, ou natureza dos negocios não exigir a preterição de algumas.

Art. 16. Os Conselheiros fallaráõ, e votaráõ, quando o Imperador ordenar.

Art. 17. Não havendo unanimidade no Conselho, os membros divergentes apresentaráõ por escripto seus votos separados.

Art. 18. Os Ministros de Estado, ainda que tomem parte nas discussões do Conselho, não votaráõ, nem mesmo assistiráõ ás votações, quando a consulta versar sobre dissolução da Camara dos Deputadas, ou do Ministerio.

Art. 19. As consultas do Conselho de Estado serão redigidas pela secção, á que tocar o seu objecto, e assignadas por todos os Conselheiros de Estado, na fórma do art. 8º

Art. 20. A Resolução Imperial, tomada sobre parecer da secção, ou consulta do Conselho de Estado, será expedida por Decreto.

CAPITULO II

Dos objectos não contenciosos

Art. 21. Cada secção examinará as Leis Provinciaes, e todos os negocios, de que a encarregar o seu Presidente.

Art. 22. A cada secção é permittido ouvir a quaesquer empregados publicos, que não poderão negar-se a prestar todos os esclarecimentos, que lhes ella exigir, vocaes, ou por escripto, pena de desobediencia. Poderá outrosim ouvir a quaesquer outras pessoas, cujas informações lhe possão ser uteis.

Art. 23. Quando, no exame dos negocios incumbidos ás secções, entenderem estas que é necessaria alguma Lei, Regulamento, Decreto, ou lnstrucções, o proporáõ, expondo mui circumstanciadamente os motivos de sua convicção, e as principaes providencias, que se devem expedir.

CAPITULO III

Dos objectos contenciosos

Art. 24 Quando o Presidente de uma Provincia, ou o Procurador da Corôa na Côrte, e Provincia do Rio de Janeiro, tiver noticia de que uma Autoridade Judiciaria está effectivamente conhecendo de algum objecto administrativo, exigirá della os esclarecimentos precisos, bem como as razões, pelas quaes se julga com jurisdicção sobre o objecto.

Art. 25. Se forem consideradas improcedentes as razões, em que a Autoridade Judiciaria firmar sua jurisdicção, ordenará o Presidente, ou o Procurador da Corôa, que cesse todo o ulterior procedimento, e sejão citados os interessados, para em um prazo razoavel deduzirem seu direito.

Art. 26. Findo o prazo, se o Presidente entender que o negocio é administrativo, assim o resolverá provisoriamente, remettendo todos os papeis a respeito delle, com a sua decisão, á Secretaria da Justiça.

Se porém entender que o negocio não é administrativo, á vista dos novos esclarecimentos que tiver obtido das partes, ou da mesma Autoridade Judiciaria, declarará que não tem lugar o conflicto, e que continue o processo no Foro Judicial.

Art. 27. O Ministro da Justiça, ou o conflicto tenha sido suscitado pelo Procurador da Corôa, ou por algum dos Presidentes, commetterá o seu exame á respectiva secção, a qual, depois de ouvidas as partes, se estas o requererem, interporá o seu parecer.

Art. 28. Quando o conflicto de jurisdicção consistir em se julgarem incompetentes, tanto a Autoridade Judiciaria, como a administrativa, a secção dará o seu parecer, ouvidas ambas.

Art. 29. Quando o conflicto fôr entre Autoridades administrativas, se procederá na fórma dos artigos antecedentes no que lhe forem applicaveis.

Art. 30. Os Presidentes das Provincias conheceráõ dos abusos das Autoridades ecclesiasticas, procedendo na fórma do Regulamento nº 10 de 19 de Fevereiro do 1838, no que lhe forem applicaveis suas disposições.

Art. 31. Em geral serão observadas todas as disposições do processo actual, que, contribuindo para descobrimento da verdade, sem prejuizo da celeridade indispensavel á marcha administrativa, forem admissiveis neste processo, e não se oppuzerem ás determinações do presente Regulamento.

Art. 32. As questões relativas á presas serão decididas pelo Governo em primeira e ultima instancia.

Art. 33. No processo administrativo se observará em geral o seguinte: a parte apresentará na respectiva Secretaria de Estado petição acompanhada dos documentos, com que pretende justificar sua intenção.

Art. 34. Se fôr attendivel á petição, a secção proporá que sejão ouvidos os interessados, para o que lhes será feita a intimação.

Art. 35. A secção poderá requerer ao seu Presidente avaliações, inquirições de testemunhas, depoimento de partes, e quantas diligencias julgar necessarias para esclarecimento da verdade, ás quaes procederá por si mesma, quando lhe seja possivel.

Art. 36. Na conferencia seguinte á em que a secção tiver ultimado as diligencias sobreditas, ou na em que o Presidente, attendendo á natureza do negocio, designar, apresentará o seu relatorio, a cuja leitura poderão os interessados por seus Advogados assistir, e fazer os reparos precisos para sua rectificação.

Art. 37. Haverá até dez Advogados do Conselho do Estado, aos quaes sómente será permittido assignar as petições, e quaesquer allegações, ou arrazoados, que tiverem de ser apresentados ao Conselho, e ás suas secções; bem como assistir ao depoimento, e mais actos do artigo trinta e cinco.

Art. 38. O Advogado, que faltar ao devido respeito ao Conselho, ás secções, ou a cada um dos Conselheiros, será demittido; e, se fôr em acto do Officio, além de demittido, será punido na fórma das Leis.

Art. 39. Os prazos assignados ás partes para responderem, recorrerem, ou produzirem quaesquer documentos, e provas, não poderão exceder a dez dias, residindo na Côrte, ou no seu termo.

Art. 40. O Ministro da Justiça marcará em Avisos, que farão parte deste Regulamento, os prazos, que, além dos dez dias do artigo antecedente, devem ser concedidos ás partes, em attenção ás distancias, em que residirem, ou estiverem os documentos e provas, que houverem de produzir.

Art. 41. O processo administrativo só poderá ser suspenso nos casos seguintes:

1º Fallecendo a parte, ou seu Advogado, ou impossibilitando-se este de exercer suas funcções antes do ultimo relatorio da secção.

2º Sendo arguido de falso algum documento, ou testemunha, nos termos do artigo seguinte.

Art. 42. Feita a arguição de falsidade a qualquer documento, ou testemunha, se parecer ás secções, ou Conselho, que é elle indispensavel á decisão do negocio, e não querendo a parte renuncia-lo, será suspenso o processo, até que em Juizo competente se decida a falsidade.

Art. 43. Se a secção, ou Conselho entender que tal testemunha, ou documento não é necessario para decisão do negocio, continuará o processo sem embargo da dita arguição.

Art. 44. O mesmo terá lugar, quando a parte, que produzio a mencionada testemunha, ou documento, nada responder ou delle desistir.

Logo que uma semelhante arguição for feita, e a considerar procedente a secção, ou Conselho, será intimada a parte, que o tiver produzido, para dizer a bem de seu direito.

Art. 45. Das resoluções dos Presidentes das Provincias em negocios contenciosos poderão as partes interpor recurso dentro de dez dias por petição munida dos precisos documentos, que manifeste as razões do gravame soffrido; e os Presidentes a remetteráõ com informação, ou seis ella, á respectiva Secretaria de Estado.

Art. 46. Tambem terá lugar recurso das decisões dos Ministros de Estado em materia contenciosa, e tanto este como o do artigo antecedente, poderá ser decidido por Decreto Imperial, sem se ouvir, ou ouvindo-se as respectivas secções, e o Conselho de Estado.

Art. 47. A resolução Imperial tomada sobre parecer de secção, Consulta do Conselho, ou sem ella, em virtude do processo, de que trata este Capitulo, só poderá ser embargada nos casos:

1º De não ter sido intimado algum dos prejudicados.

2º De ter corrido o processo á revelia, que não possa ser imputada ao condemnado.

Art. 48. Os embargos, no caso do artigo antecedente, só terão lugar antes que o Decreto Imperial seja remettido para a Autoridade Judiciaria, ou dentro dos dez dias contados do em que foi feita intimação ao condemnado.

Art. 49. Os embargos serão apresentados pelo respectivo Ministro ao Conselho, o qual consultará ao Imperador para os desattender, ou para reformar a Imperial Resolução, ou para ordenar que de novo seja examinada na competente secção.

Art. 50. No caso de ser a Resolução Imperial de novo examinada, poderá sua execução ser suspensa pelo respectivo Ministro, quando na demora não haja perigo, e de não ser suspensa possa resultar damno irreparavel.

Art. 51. A Imperial Resolução será executada como qualquer sentença judiciaria, e pelos mesmos Juizes, e fórma, pela qual estas o são.

Sendo condemnada a Administração, a execução será feita administrativamente.

CAPITULO IV

Das disposições geraes

Art. 52. Haverá sempre em effectivo serviço doze Conselheiros de Estado, um dos quaes escreverá as actas dos negocios que deverem ser conservados em segredo.

Art. 53. Se algum Conselheiro em effectivo serviço não puder exercer suas funcções por mais de quinze dias continuos, será designado o Conselheiro de Estado extraordinario, que ha de servir durante o seu impedimento cessando o qual, cessará tambem a substituição, independente de nova ordem.

Art. 54. O Conselheiro de Estado, que fôr Ministro de Estado, ou empregado em qualquer Commissão, cujo exercido fór incompativel com as funcções do Conselho, será considerado impedido, e se lhe applicará o disposto no artigo antecedente.

Art. 55. O Conselheiro, que fór dispensado do exercicio de suas funcções, passará a Conselheiro extraordinario.

Art. 56. Só perceberáõ gratificações os Conselheiros em effectivo serviço.

Art. 57. Os Conselheiros de Estado, nos actos publicos, e funcções da Côrte, occuparáõ o primeiro lugar depois dos Ministros e Secretarios de Estado; terão o tratamento de Excellencia; gozaráõ das honras, de que gozão os mesmos Ministros; e usaráõ do uniforme de que estes usão, tendo porém nas mangas da farda, acima dos canhões bordados, uma esphera, e sobre esta a Corôa Imperial.

Art. 58. Todas as Autoridades publicas são obrigadas a cumprir as determinações expedidas em virtude deste Regulamento, e tendentes á sua execução.

Art. 59. Haverá no Conselho, e em cada uma de suas secções tres livros.

1º Para registro das Actas respectivas.

2º Para registro das Ordens Imperiaes.

3º Para registro dos pareceres, e consultas.

Art. 60. Ficão revogadas todas as disposições em contrario.

Candido José de Araujo Vianna, do Meu Conselho, Ministro e Secretario de Estado dos Negocios do Imperio, assim o tenha entendido e faça executar com os despachos necessarios. Palacio do Rio de Janeiro em cinco de Fevereiro de mil oitocentos e quarenta dous, vigesimo primeiro da Independencia e do imperio.

Com a Rubrica de Sua Magestade o Imperador.

Candido José de Araujo Vianna.