DECRETO - DE 9 DE DEZEMBRO DE 1833
Manda observar o Regulamento desta data para o hospital da Armada e corpo da artilharia da Marinha.
A Regencia, em Nome do Imperador o Senhor Pedro II, Tendo em vista, não só a maior regularidade do serviço, mas tambem o melhor tratamento dos doentes da Armada, e corpo da artilharia da Marinha, e economia da Fazenda Publica no hospital, que para isso se mandára formar na Ilha das Cobras: Ha por bem que se oberve o Regulamento, que com este baixa, assignado por Joaquim José Rodrigues Torres, do Conselho de Sua Magestade Imperial, Ministro e Secretario de Estado dos Negocios da Marinha que assim o tenha entendido, e expeça para esse effeito as ordens necessarias. Palacio do Rio de Janeiro, em nove de Dezembro de mil oitocentos trinta e tres, decimo segundo da Independencia e do Imperio.
FRANCISCO DE LIMA E SILVA.
JOÃO BRAULIO MONIZ.
Joaquim José Rodrigues Torres.
Regulamento para o hospital da Armada e artilharia da Marinha
SECçÃO I
TITULO I
DO ESTABELECIMENTO, LOCAL, E DIVISÃO INTERINA DO HOSPITAL
Art. 1º Estabelecer-se-ha um hospital para os doentes da Armada, e corpo da artilharia da Marinha no local, já determinado para este fim.
Art. 2º Terá este hospital as seguintes repartições:
§ 1º Duas, ou mais enfermarias, em que se accommodem os doentes, que diariamente possam haver, de maneira que cada enfermaria não contenha mais de trinta doentes.
§ 2º Uma sala, ou enfermaria propria para os officiaes da Armada, e artilharia da Marinha, que houverem de ser curados no hospital.
§ 3º Uma casa clara, e arejada para o deposito, não só dos apparelhos, e instrumentos cirurgicos para as grandes operações, e curativo diario, e das substancias, ou formulas pharmaceuticas, que pela pratica se julgue indispensavel haver no hospital para prompto soccorro dos enfermos em casos urgentes, como tambem para nella se fazerem as operações e autopsias necessarias.
§ 4º Um quarto para o Cirurgião effectivo.
§ 5º Um quarto em cada enfermaria para os Enfermeiros.
§ 6º Uma casa para deposito da roupa, e todos os utensis.
§ 7º Uma cozinha e dispensa.
TITULO II
DIRECTOR DO HOSPITAL
Art. 3º Haverá um Professor com o titulo de Director do Hospital da Marinha, o qual terá a seu cargo o seguinte:
§ 1º Inspeccionar, todas as vezes que julgar necessario, o hospital, declarando o resultado de sua inspecção no livro competente, com a sua assignatura, e data.
§ 2º Presidir ás conferencias, e assistir ás grandes operações, praticando-as, ou mandando-as praticar pelo 1º Cirurgião.
§ 3º Fazer reunir uma vez cada mez, e todas as vezes que o julgar necessario, os Facultativos do hospital, a fim de se tratar dos melhoramentos, que este possa receber, não só pelo que pertence ao tratamento dos enfermos, como á economia da Fazenda.
Art. 4º Sempre que o Director achar falta de alguns objectos necessarios para o tratamento dos doentes, ou em estado de não poderem servir, dará as providencias precisas, para que sejam fornecidos outros pela Estação competente, dando conta á Secretaria de Estado dos Negocios da Marinha, se esta falta provier de alguns dos empregados.
Art. 5º O Director tomará todo o interesse pela boa administração do Hospital, tanto pelo que pertence ao bom tratamento dos doentes, como á economia das dietas, fazendo as advertencias que julgar precisas, aos outros empregados delle.
Art. 6º Além destas obrigações, pertencem-lhe todas as mais, que lhes são marcadas neste Regulamento.
TITULO III
MEDICO
Art. 7º Haverá um Medico consultante, nomeado pelo Governo para os casos graves, que occorrerem no Hospital da Marinha.
Art. 8º O Medico consultante irá ao hospital todas as vezes, que fôr convocado pelo Director, e á hora por elle designada.
Art. 9º Depois de ter examinado os enfermos, que fazem o objecto da consulta, e de accôrdo com os outros Facultativos, prescreverá os medicamentos necessarios, e continuará a visital-os diariamente, emquanto a molestia exigir a sua presença.
Art. 10. O Medico consultante não poderá ausentar-se, sem licença do Governo, e sem deixar quem o substitua; o que fará tambem no caso de molestia.
TITULO IV
PRIMEIRO CIRURGIÃO
Art. 11. Haverá um 1º Cirurgião do Hospital da Marinha, o qual terá a seu cargo:
§ 1º Visitar diariamente os doentes do hospital, das sete ás oito horas da manhã, desde o 1º de Novembro, até o ultimo de Março; e das oito ás nove, desde o 1º de Abril, até o ultimo de Outubro, repetindo a visita do tarde, sempre que julgar necessario, e quando fôr chamado pelo Cirurgião effectivo, para acudir a successos graves e inesperados.
§ 2º Praticar as grandes operações, quando o Director as não pratique, e fazer o curativo das molestias cirurgicas mais graves.
§ 3º Receitar por seu proprio punho no livro do receituario pelos numeros do Formulario, e escrever nas papeletas o diagnostico das molestias, as dietas, as observações diarias, os medicamentos receitados, tendo todo o cuidado, para que não haja enganos desastrosos.
§ 4º Participar ao Director, quando achar necessidade de praticar alguma das grandes operações, para que este, convocando os Cirurgiões da Armada ou do corpo da artilharia de Marinha, que forem precisos, se decida em conferencia, presidida por elle, da necessidade de tal operação; devendo impreterivelmente assistir a ella os Cirurgiões conferentes, e todos aquelles, que o Director julgar necessarios; e só em caso urgente, em que a vida do enfermo corra immediato perigo, é que o Primeiro Cirurgião poderá fazer, sem estas formalidades, semelhantes operações, sendo comtudo obrigado a dar logo parte motivada, por escripto ao Director.
§ 5º Fazer autopsias, quando julgar necessarias, para verificar a séde, e a natureza da molestia, principalmente tendo occorrido duvidas sobre seu diagnostico, devendo escrever nas papeletas tudo o que achar de mais notavel, ou que possa servir para o aperfeiçoamento da arte de curar.
Art. 12. Quando aconteça entrarem no hospital doentes, que pelo seu numero, e identidade de molestia, etc., se conheça ter grassado em alguns dos navios armados, existentes no porto, ou entrados, ou no corpo de artilharia da Marinha, qualquer molestia epidemica, ou contagiosa, o Primeiro Cirurgião participará, por escripto, ao Director, para se providenciar conforme o caso exigir, examinando-se com a maior circumspecção a natureza da molestia, suas causas reconhecidas, ou provaveis, para que o Director proponha ao Governo os meios mais capazes de atalhar o mal.
Art. 13. O 1º Cirurgião, de accôrdo com o Medico consultante, fará formularios por numeros, para facilitar o receituario, e promptificação dos medicamentos.
Art. 14. O 1º Cirurgião terá a mais severa vigilancia, para que os meios therapeuticos cirurgicos necessarios, e as substancias, ou formulas pharmaceuticas, que se acharem no deposito do hospital para soccorro dos enfermos em casos urgentes, possam conservar-se no melhor estado possivel; e bem assim sobre as qualidades dos medicamentos fornecidos diariamente para o hospital, tomando com os outros facultativos todo o interesse por tudo, que deva concorrer para mais util, e vantajoso tratamento dos doentes, e economia da Fazenda.
Art. 15. Quando qualquaer doente tiver alta, o 1º Cirurgião marcará nesta os dias de convalescencia, que elle deve ter: o Commandante do navio, ou do corpo, a que pertença o doente, é obrigado a fazer observar restrictamente a convalescendo designada.
TITULO V
SEGUNDO CIRURGIÃO EFFECTIVO
Art. 16. Haverá um 2º Cirurgião effectivo, o qual deverá residir no Hospital.
Art. 17. Pertence ao Cirurgião effectivo:
§ 1º Visitar os doentes, logo que se apresentam no hospital, enchendo as papeletas com o nome do doente, navio, ou corpo, a que pertence, e destinar-lhes lugar na enfermaria, segundo a molestia que tiver.
§ 2º Marcará nas papeletas as dietas, que devem ter naquelle dia os doentes, que entrarem depois da visita, e escreverá no livro do receituario os medicamentos, que julgar convenientes, prestando todos os mais auxilios, que forem necessarios.
§ 3º Acompanhar nas visitas o 1º Cirurgião para se prestar ao curativo, explicações externas, que forem necessarias neste acto, devendo, logo depois que a visita fôr terminada, passar o receituario do dia para uma folha volante, a qual será immediatamente remettida ao Boticario fornecedor; sendo estas folhas em cima numeradas, e com a declaração - Hospital da Marinha -, e no fim a data com a sua assignatura, e do Escrivão do Hospital, as quaes folhas servirão de titulo para o Boticario exigir seu pagamento, depois de serem confrontadas com o livro do receituario, rubricadas pelo Director.
§ 4º Assistir ao recebimento diario dos generos para as rações, e dietas, a fim de observar que sejam de boa qualidade, e da quantidade designada na relação, apresentada pelo 1º Enfermeiro.
§ 5º Receber do Fiel o panno, e fios para o curativo diario, e provimento dos appositos, que deve haver sempre promptos para os casos extraordinarios, e para as operações; passando-lhe recibo, em que declare o piso dos fios, quantidade de varas de panno, sua qualidade, e largura.
§ 6º Cuidar na limpeza, e conservação dos instrumentos cirurgicos, que se acharem no deposito do Hospital.
§ 7º Fazer as autopsias, a que não puder proceder o Medico, e 1º Cirurgião.
§ 8º Exercer todas as funcções do 1º Cirurgião no seu impedimento.
§ 9º Vaccinar a todos os individuos pertencentes á Armada, e Corpo da Artilharia da Marinha, quando se apresentarem para este fim.
Art. 18. O 2º Cirurgião effectivo terá no Hospital um quarto.
TITULO VI
CAPELLÃO
Art. 19. Para que nunca falte no hospital a administração dos Sacramentos, e os outros soccorros espirituaes, de que os doentes possam precisar, haverá um Capellão destinado para esse fim, o qual se apresentará no hospital, logo que fôr chamado, devendo ser exactissimo nos seus deveres.
Art. 20. O Cirurgião effectivo chamará, por escripto, o Capellão do hospital, sempre que for preciso, declarando-lhe o motivo, por que é chamado: e no caso delle não comparecer, dará parte ao Director, para este providenciar, como fôr necessario.
TITULO VII
ESCRIVÃO
Art. 21. Haverá no Hospital da Marinha um Escrivão, o qual terá as seguintes incumbencias:
§ 1º Fará toda a escripturação nos livros do hospital, e o mappa diario dos enfermos existentes, declarando não só as classes, á que pertencem, mas ainda os entrados, sahidos, e fallecidos: fará tambem o mappa das dietas, conforme o modelo nº 1, os quaes mappas, depois de assignados pelo 1º Cirurgião, serão archivados.
Art. 22. Devendo constar dos mappas as quantidades, e qualidades dos generos, de que se compuzerem as rações diarias, o Escrivão o fará de modo que, depois de rubricados, não possam admittir emenda alguma, e acontecendo o contrario, não se levará em conta o genero, que ahi se achar.
TITULO VIII
FIEL
Art. 23. Haverá um Fiel, o qual encarregar-se-ha da roupa, camas, moveis, e todos os utensis das enfermarias, e das cozinhas; bem como de todos os generos, que entrarem no hospital, tanto para as dietas, como para o sustento dos empregados, tendo tudo na melhor arrecadação possivel.
Art. 24. Prestará contas no fim de cada um anno financeiro na Contadoria da Marinha.
Art. 25. Prestará uma fiança do valor de dez por um do ordenado, que se lhe arbitrar.
TITULO IX
ENFERMEIROS
Art. 26. Haverá os Enfermeiros, que forem precisos, na proporção de um para quinze doentes; porém quando o numero destes fôr de vinte e cinco a quarenta, haverá no primeiro caso dous Enfermeiros e no segundo tres, e assim por diante.
Art. 27. Os Enfermeiros serão nomeados pelo Director, podendo ser tirados dentre as praças do Corpo da Artilharia da Marinha, escolhendo-se as de melhor conducta, e que estiverem nas circumnstancias de poderem exercer este emprego: Sendo comtudo necessario que saibam ler, e escrever, para cuja escolha o Director se entenderá com o Commandante do referido corpo.
Art. 28. Director escolherá dentre os Enfermeiros um, que fôr mais habil, e de mais confiança, para servir de Primeiro Enfermeiro, o qual será encarregado sómente das seguintes obrigações:
§ 1º Fará diariamente uma relação, contendo os generos necessarios para as dietas, extrahida das papeletas, e as rações dos empregados com as suas competentes declarações, a qual será rubricada pelo Cirurgião effectivo, para ser entregue ao Fiel, a fim de receber a somma dos generos, que se acharem na mesma relação designados, precedendo despacho do Director.
§ 2º Entregará ao Cozinheiro tudo quanto fôr preciso para dietas, e terá a seu cargo a vigilancia, e fiscalisação da cozinha, e governo dos empregados nella, para que a comida seja bem feita, e com asseio, que esteja prompta para se distribuir ás horas determinadas, e que não haja extravios nos generos.
§ 3º Acompanhará os Facultativos nas visitas para os informar do que fôr preciso, e por si mesmo saber o que elles determinam, a fim de observar melhor se os outros Enfermeiros cumprem exactamente com as suas obrigações, do que será responsavel aos Facultativos.
§ 4º Receberá do Fiel, com as formalidades recommendadas no § 1º, a roupa, e todos os utensis para o serviço das enfermarias, a fim de os entregar aos outros enfermeiros quando forem precisos para os seus respectivos doentes, ficando responsavel pelas faltas que houver.
§ 5º Assistirá á distribuição das dietas, para saber se combinam exactamente com as papeletas, e relações.
Art. 29. Os outros Enfermeiros serão empregados no serviço mais immediato dos doentes, de que se acharem encarregados, com as seguintes obrigações:
§ 1º Distribuirão a comida ás horas prescriptas no presente Regulamento - art. 63 do titulo 5º da 2ª secção -, e marcadas pelos Facultativos nas papeletas em presença do Primeiro Enfermeiro, conservando-se nas enfermarias todo o tempo, em que os doentes comerem, para lhes prestarem os serviços necessarios nesta mesma occasião, e recolherem depois da comida a louça, talheres, e todos os utensis, a fim de cuidarem da limpeza dos mesmos.
§ 2º Darão os remedios ás horas marcadas nas papeletas pelos Facultativos.
§ 3º Mandarão fazer a limpeza do hospital pelos serventes ás cinco horas da manhã no verão, e ás seis no inverno; e bem assim varrer, e lavar o hospital todas as vezos, que fôr necessario, e conservando-o no maior asseio possivel, arejando-o, e desinfectando-o todas as vezes que fôr ordenado pelos Facultativos, tendo igualmente todo o cuidado no asseio das camas dos seus doentes.
§ 4º Receberão do Primeiro Enfermeiro, não só toda a roupa precisa para o serviço dos seus respectivos doentes, como tambem todos os vasos, e utensis necessarios, entregando ao mesmo a roupa, que estiver suja, para ser substituida por outra, e os utensis, que se quebrarem, ou inutilisarem, apresentando os pedaços dos que se quebraram, para receberem outros.
§ 5º Farão as vigilias, que lhes competirem segundo a escala, que fizer o Primeiro Enfermeiro, quando haja doentes de perigo, e Ihes fôr ordenado pelo Primeiro Cirurgião.
Art. 30. Além dos empregados acima mencionados, haverá um Comprador, ou Agente, e um Cozinheiro, nomeado pelo Director. O Agente será obrigado a comprar tudo o que fôr necessario para o hospital; e o cozinheiro preparará a comida, e dietas do hospital.
Art. 31. Os Enfermeiros, Agente, e Cozinheiro terão, além da gratificação, que se lhes arbitrar, uma ração, a qual constará, para o almoço, de oito onças de pão, duas onças de assinar, uma onça de café; para o jantar duas libras de carne, duas onças de toucinho e duas de arroz, e um decimo de farinha; na qual ficará incluida outra qualquer ração, que lhes possa competir.
Art. 32. O Director requisitará ao Quartel-General da Marinha o numero de individuos necessarios para fazerem o serviço interno, e externo do hospital, como conduzir agua, mantimentos, lavar enfermarias, fazer as limpezas, etc.
SECÇÃO II
TITULO I
DA FISCALISAÇÃO, CONTABILIDADE, E ESCRIPTURAÇÃO
Art. 33. Para se occorrer ás despezas dos doentes, haverá no Hospital da Marinha uma caixa, onde sejam recebidos os meios soldos dos officiaes, que se curarem no hospital; e bem assim os vencimentos de pret, e etapa respectivos ás differentes praças do Corpo de Artilharia da Marinha, e os soldos dos officiaes de prôa dos navios da Armada, marinheiros, e grumetes, e valores de suas rações.
Art. 34. O dinheiro desta caixa será sómente despendido: 1º com as compras das dietas diarias, e extras prescriptas pelos Facultativos, e generos necessarios para sustento dos empregados; 2º com a limpeza, e desinfecção das enfermarias; 3º com os reparos, e lavagem da roupa das enfermarias; 4º com aquelles objectos, que a evidente necessidade reclame a pedido dos Facultativos, com conhecimento do Director.
Art. 35. Poderão ser recebidas no Hospital da Marinha todas as praças dos reformados, as quaes, durante o tempo, que estiverem no hospital, perderão igualmente o soldo a favor da caixa.
Art. 36. Os fundos, que neste Regulamento se destinam para a manutenção do hospital, serão recebidos pelo Escrivão na Pagadoria da Marinha, onde devem estar feitos os descontos dos soldos, e valores das rações das praças, que forem para o hospital.
Art. 37. A caixa, de que trata o art. 33, terá tres chaves, das quaes, uma estará entregue ao Fiel, outra ao Escrivão e a terceira ao Director.
Art. 38. As sommas designadas nos arts. 33, e 35, serão recebidas pelo Fiel na Pagadoria da Marinha, e irão acompanhadas de uma guia, passada pelo Escrivão da Pagadoria, averbada, e debitada na Contadoria da Marinha, pela qual guia fará o Escrivão do hospital a carga ao Fiel no livro caixa, ficando archivada como peça justificativa de sua receita, para ser apresentada, quando prestar contas na dita Contadoria.
Art. 39. As sommas, que despender o Fiel, em virtude de ordens legaes do Director, serão á vista dellas, e dos conhecimentos em fórma, e dos recibos, que exigirem as partes, lançadas em despeza pelo Ecrivão no mesmo livro caixa, devendo ser todas estas peças igualmente archivadas para o fim mencionado no artigo antecedente.
Art. 40. Os generos comprados serão examinados pelo Cirurgião effectivo, o qual, achando alguns incapazes, obrigará o comprador a trazer outros bons em lugar destes, e dará parte, por escripto, ao Director, para dar as providencias.
Art. 41. Quando o comprador, ou fornecedor de quaesquer generos tiver de entrar com elles para provimento do hospital, apresentará a respectiva factura, declarando por extenso, não só a medida, ou peso de cada um desses generos, mas tambem o preço, por que foram comprados, bastando que os calculos da importancia de cada um delles, e o da sua totalidade sejam escriptos em algarismos; e achando-a o Director exacta dará na mesma factura o seguinte despacho - Receba-se e carregue-se em receita ao Fiel, extrahindo-se conhecimento em fórma para a parte haver seu pagamento.
Art. 42. Recebidos pelo Fiel os generos de que constar a factura, na qual passará elle recibo, o Escrivão os carregará immediatamente em receita, addição por addição, extrahirá conhecimento em fórma, mencionando cada uma das parcellas, e a sua totalidade, para o que verificará se está exacto o calculo das facturas, o qual conhecimento, depois de averbado á margem da receita, d'onde se extrahir, será entregue á parte, para apresental-o ao Director, a fim de obter deste despacho para o pagamento; despacho, que será dado no mesmo conhecimento em fórma, sem dependencia de qualquer outra formalidade.
Art. 43. As facturas deverão ser numeradas, e archivadas, como documento para a conferencia com a receita.
Art. 44. O Escrivão, á vista dos conhecimentos em fórma, que forem pagos pelo Fiel, averbará os pagamentos delles á margem das receitas correspondentes.
Art. 45. O Fiel entregará ao Primeiro Enfermeiro os generos, que forem precisos para as rações, e dietas, segundo a relação diaria, que este lhe apresentar, extrahida das papeletas. Estas rações serão assignadas pelo Cirurgião effectivo, e terão despacho do Director para a entrega.
Art. 46. O Escrivão, á vista destas relações, nas quaes deve o primeiro Enfermeiro passar o competente recibo, lançará em despeza ao Fiel os generos, que por este forem entreges áquelle, e as mencionadas relações serão numeradas, e archivadas, e servirão de documentos para a conferencia com a despeza.
Art. 47. No fim de todos os mezes as contas do hospital serão examinadas polo Director, o qual dará parte á competente Secretaria de Estado de qualquer abuso, que nellas encontrar.
Art. 48. Todas as praças, que forem para o hospital, levarão a competente guia, assignada pelo Capitão da Companha, ou Official do Estado-Maior, sendo do Corpo de Artilharia da Marinha, pelo Commandante do navio, seu Immediato, ou Official de Divisão, sendo de navio armado; pelo lnspector do Arsenal, ou seu Ajudante, quando pertencer a esta Repartição; e finalmente pelo Encarregado do Quartel-General da Marinha, sendo da Armada, e que não esteja em effectivo serviço: as guias conterão todas as declarações do estylo.
Art. 49. Haverá um Conselho do Administração composto do Director do hospital, Cammandante do Corpo do Artilharia da Marinha, Inspector do Arsenal e o Primeiro Cirurgião do hospital, o qual se reunirá de tres em tres mezes, para examinar o estado do hospital, e julgar dos melhoramentos, que este possa receber, lavrando-se de tudo uma acta, que todos assignarão, extrahindo-se uma copia, que será remettida ao Governo pela competente Repartição.
Art. 50. Haverá no hospital, para arranjo de sua escripturação, e contabilidade, nove livros com as seguintes denominações:
1º Registro das entradas, e sahidas dos doentes do hospital da Marinha, o qual será riscado em fórma de mappa segundo o modelo 2;
2º Inventario do Hospital da Marinha;
3º Um livro de receita;
4º Um livro de despeza;
5º Um livro caixa;
6º Um livro mappa de receita e despeza;
7º Registro da correspondencia official, termos, e actas do Hospital da Marinha;
8º Livro de receituario do Hospital da Marinha;
9º Livro para os officiaes, que visitarem os doentes, transcreverem as partes, que derem ás respectivas autoridades.
No primeiro se farão todos os assentos, e declarações, que contiver a guia, nome, idade, naturalidade, estado, e filiação, companhia, e graduação, ou a praça que tiver a bordo, não sendo militar, e o nome do navio, a que pertence: assentar-se-ha igualmente o fato, com que entrou no hospital, declarando-se todas as peças pelos seus nomes: quando tiver alta, se lhe dará sahida no competente assento; e se fallecer, se notará do mesmo modo o dia, mez, e anno.
O segundo servirá para se lançar o inventario de todos os objectos, que existirem no hospital, e dos que forem entrando de novo, fazendo-se tambem o assento dos que sahirem, ou se inutilizarem.
O terceiro será o livro de carga do Fiel, no qual se assentarão os generos, que entrarem; e o quarto o de despeza daquelles, que se consumirem, ou estragarem.
O quinto servirá para de um lado se assentar o dinheiro recebido, e do outro, em que foi despendido.
Para o sexto, e debaixo do titulo de cada um dos generos, e suas qualidades, passará o Escrivão diariamente todas as addições, que lançar no livro de receita e despeza, escrevendo á margem de cada uma destas, as folhas do livro mappa, a que as levar; assim como os lançamentos, que fizer neste, se referirão ás folhas dos livros de receita, e despeza.
Finalmente o setimo, oitavo e nono servirão para o que já se acha designado acima. Todas as folhas destes livros serão rubricadas pelo Director; e terão os termos de abertura, e encerramento, assignados por elle.
Art. 51. Os medicamentos para o Hospital de Marinha serão fornecidos por uma botica particular. Este fornecimento será arrematado em hasta publica, perante o Conselho de Administração no lugar, dia, e hora, annunciado por editaes, assignados pelo Director do hospital: o fornecimento será conferido a quem por menos fizer, servindo de base um formulario, que tenha á margem o preço arbitrado a cada medicamento.
Art. 52. Ultimado o contracto, levará o Boticario fornecedor uma copia do formulario, e se remetterá outra ao hospital, procedendo-se todos os annos a uma nova arrematação dos medicamentos. O Director fiscalisará este contracto, evitando todo o abuso, que nelle possa haver.
Art. 53. Os medicamentos fornecidos conformemente aos artigos antecedentes, não serão carregados em receita ao Fiel, como é determinado no art. 42; mas calculada a importancia da factura, ou conta dellas pelo Escrivão, dará o Director o despacho para seu pagamento na fórma do mesmo art. 42, e exigida no § 3º do art. 17, tit. 5º.
TITULO II
REQUISIÇÕES
Art. 54. Todas as requisições para o hospital serão feitas pelo Director á Secretaria de Estado da Reparticão competente; e logo que o hospital estiver organizado, estas requisições serão feitas em consequencia dos pedidos, que ao Director fizerem o 1º Cirurgião, e o Fiel.
Art. 55. Quando houver no hospital roupa, instrumentos cirurgicos, e mais utensis em estado de não poderem servir, o encarregado destes objectos participará ao Director, para que este na primeira reunião do Conselho de Administração mostre a necessidade dos novos artigos, fazendo-se no competente livro um termo disso, assignado por todos os membros do Conselho, e pelo Escrivão; remettendo o Director uma copia á Secretaria de Estado competente, a fim de mandar-se fazer o novo fornecimento, e dar-se aos objectos inutilisados a applicação, que mais conveniente parecer.
TITULO III
MAPPAS
Art. 56. O Primeiro Cirurgião dará todas as semanas ao Director um mappa de todos os movimentos do hospital, conforme o modelo nº 4, e no fim de cada mez dará tambem outro mappa geral, para ser remettido ao Ministro da respectiva Repartição pelo Director.
Art. 57. No fim de cada trimestre mandará o Director ao Ministro e Secretario de Estado da Marinha, um relatorio do estado do hospital, no qual dará uma informação de todos os empregados, sua pericia, ou incapacidade.
TITULO IV
PAPELETAS
Art. 58. Cada doente terá á cabeceira da cama uma papeleta, conforme o modelo nº 5, na qual os assistentes marcarão a dieta, remedios internos, e externos, e classificarão as enfermidades, escrevendo os symptomas, e circumstancias mais notaveis, que observarem, e no fim da cura serão assignadas pelo Assistente, com a declaração do dia da alta.
Art. 59. Estas papeletas serão depois guardadas no escriptorio do hospital, para dellas se extrahirem as notas, e esclarecimentos, que forem precisos: as papeletas, e altas serão impressas, e cheias pelo Cirurgião effectivo.
TITULO V
DIETAS
Art. 60. Haverá no hospital da Marinha seis qualidades de dietas, que serão compostas da maneira seguinte:
N. 1. E' composta de canjas de arroz, feitas, cada uma com uma onça de arroz, e outra onça de assucar refinado.
N. 2. Caldos de gallinha, na proporção de uma gallinha para oito caldos.
N. 3. Caldos de vacca, ou vitella, na proporção de uma libra de vacca para quatro caldos. O numero das dietas precedentes será determinado pelos Facultativos, e marcado nas papeletas; e poderão abonar em lugar de arroz, cevadinha, e em lugar de caldo de vacca, o de mão de vacca.
N. 4. Ao almoço quatro onças de pão, e uma porção de caldo da panella geral: ao jantar um quarto de gallinha cosida, quatro onças de pão, ou seis onças de farinha de mandioca, e o caldo do mesmo quanto baste para molhar o pão, ou a farinha; á ceia canja.
N. 5. Ao almoço seis onças de pão, uma de assucar; ao jantar oito onças de carne de vacca cosida, seis onças de farinha de mandioca, com uma porção de caldo da panella geral para molhar a farinha, e duas onças de arroz, feito em caldo; á ceia quatro onças de carne assada, e duas onças de arroz feito em caldo.
N. 6. Almoço o mesmo da dieta nº 5; ao jantar oito onças de carne secca, quatro onças de feijão, uma onça de toucinho, seis onças de farinha de mandioca; ceia a mesma dieta nº 5.
Aos almoços das dietas nos 5 e 6 podem os Facultativos abonar, quando julgarem necessario, meia onça de manteiga, duas oitavas de chá, ou uma porção de café.
As gallinhas, e carne (excepto aquella, que deve servir para as ceias das dietas nos 5 e 6) devem ir logo pela manhã á panelIa geral, exceptuando-se tambem as gallinhas, que devem servir para a dieta nº 2, e a carne para a dieta nº 3; porquanto os caldos destas dietas serão feitos á parte, para se distribuirem, como fôr ordenado pelos Facultativos, segundo o numero marcado nas papeletas.
A carne, ou gallinhas, que servirem para as dietas nos 2 e 3, devem ser descontadas das que pertencem ao jantar da dieta nº 4, e ao da dieta nº 5; porquanto, depois de feitos os caldos, serão distribuidas por aquelles doentes, a quem foram descontadas.
O caldo para o almoço da dieta nº 4, será tirado da panella geral, uma hora depois de levantar a fervura, e não excederá á quantidade necessaria para molhar bem o pão; e para a ceia das dietas nos 5 e 6 se tirará no fim outra porção, e se guardará para fazer com arroz, como fica determinado.
Art. 61. Além dos temperos precisos, levará a panella geral duas onças de toucinho, e quarenta réis de hortaliça para cada seis doentes.
Art. 62. Será permittido aos Facultativos abonarem vinho, marcando as quantidades, e bem assim outra qualquer cousa de extraordinario, além das dietas acima estabelecidas áquelles doentes, cujas circumstancias o exigirem, afastando-se o menos possivel do que se acha determinado neste Regulamento.
Art. 63. As horas das comidas serão as seguintes: almoço oito horas; jantar ao meio dia; ceia ás seis horas.
TITULO VI
RELAÇÃO DAS DIETAS
Art. 64. Haverá em cada enfermaria uma relação de dietas, conforme o modelo nº 6; assim como uma tabella de tudo quanto se dá para dietas, segundo o modelo nº 7, as quaes estarão affixadas em lugar que possam ser vistas de todos, para que os doentes saibam o que lhes pertence, e se recebem tudo quanto os Facultativos mandam dar-lhes.
Art. 65. Quando o Facultativo abonar alguma cousa extraordinaria, deverá notar na dita relação, e na papeleta, debaixo de palavras - extras - a quantidade, e qualidade do genero, juntamente com a data do dia, em que principiar, e em que cessar o abono, ficando entretanto este sómente autorizado pela papeleta.
Art. 66. As relações das dietas serão assignadas pelos Facultativos, tanto no principio, como no fim, e emmassadas, e archivadas com as papeletas.
TITULO VII
DA POLICIA E ASSEIO DO HOSPITAL
Art. 67. O hospital terá uma guarda, a qual dará as sentinellas precisas para impedirem a entrada de todas as pessoas, que não forem empregadas nelle, e a sahida dos doentes; assim como para vigiarem que ninguem entre ás escondidas, ou abusivamente, observando todas as instrucções recommendadas pelo Primeiro Cirurgião a bem da policia e boa ordem do hospital.
Art. 68. As sentinellas nunca serão postas no interior do hospital, excepto quando houver doentes criminosos, ou presos; e em tal caso, estes doentes deverão estar em lugar separado dos outros, e juntos, de maneira que possam ser vigiados por uma só sentinella.
Art. 69. Haverá entre uma, e outra cama a distancia de quatro pés ao menos.
Art. 70. Para facilitar as visitas, e evitar todo, e qualquer engano, que possa haver, tanto na distribuição dos medicamentos, como nas dietas, todas as camas serão numeradas, devendo ter entre ellas uma mesa para cada dous doentes, na qual haverá para cada um, prato, tigela, talher, bilha para agua, e escarradeira; e bem assim uma banca de retreta, sómente para aquelles doentes, que não puderem ir ás latrinas.
Art. 71. Todas as enfermarias, e principalmente as latrinas, deverão ser caiadas de seis em seis mezes, ao menos.
Art. 72. Em cada enfermaria haverá tinas proprias para banhos.
Art. 73. Logo que o doente entrar para o hospital, despirá o fato, que trouxer, para ser posto em arrecadação; e então receberá um vestido proprio do hospital, que constará de camisa, barrete, roupão, e calças, tudo branco. Os officiaes não ficam sujeitos á disposição deste artigo.
Art. 74. Pertence ao Segundo Cirurgião effectivo cuidar em que o fato dos doentes, posto em arrecadação, esteja bem acondicionado, e em que não haja nenhum extravio a este respeito; mandando-o arejar repetidas vezes, para não se damnificar; e quando eles tiverem alta, se lhes mandará entregar o seu mesmo fato, observando que seja justamente o que se acha lançado no livro.
Art. 75. As enfermarias serão bem arejadas, varridas, ao menos duas vezes no dia, lavadas, e fumigadas da maneira, por que, e quando os Facultativos julgarem conveniente.
Art. 76. Haverá em cada enfermaria um lavatorio, agua, e toalhas para uso dos doentes.
Art. 77. Nenhum doente se poderá deitar dentro da cama calçado ou vestido.
Art. 78. E' prohibido jogar no hospital, e todo genero de altercação, ou disputa, principalmente nas enfermarias, as quaes devem conservar-se no mais rigoroso silencio, a fim de não serem incommodados os doentes de molestias agudas, e graves.
Art. 79. Nenhum doente poderá sahir da sua cama, ou passear, sem que para isso tenha licença do Primeiro Cirurgião, o que só terá lugar nos intervallos das horas, em que se distribuirem os medicamentos, e as dietas, e jamais na occasião da visita dos Facultativos.
Art. 80. A palha dos enxergões será renovada quando estiver moida, e além disto, sempre que os facultativos julgarem necessario.
Art. 81. Os lençóes se renovarão de oito em oito dias, as camisas, e barretes de quatro em quatro, excepto nas molestias de pelle, ou em outras quaesquer, em que os facultativos acharem conveniente renovar mais vezes.
Art. 89. O hospital será visitado cada semana por um official de patente do Corpo de Artilharia da Marinha, nomeado pelo Commandante delle, e por outro official da Armada nomeado pelo Quartel-General: estes officiaes examinarão escrupulosamente se os enfermos de suas respectivas corporações são tratados na conformidade do presente Regulamento: concluida a visita, deverão assentar no livro para isso designado, o dia, mez, e anno, em que a fizeram, declarando expressamente se acharam, ou não, alguma falta, de modo que este assento coincida com a parte, que houverem de dar ás autoridades competentes.
Art. 83. Os doentes devem apresentar-se no Hospital de manhã, antes da hora da visita, acompanhados de um official inferior, que levará suas guias respectivas: mas em casos extraordinarios serão admittidos a qualquer hora do dia, ou da noite.
Art. 84. O Director do Hospital empregará toda a vigilancia, para que o presente Regulamento seja com pontualidade executado por aquellas a quem competir; exercendo a mais austera fiscalisação no que fôr relativo ao asseio, tratamento e curativo dos doentes, e economia da Fazenda.
Palacio do Rio de Janeiro, em 9 de Dezembro de 1833.
Joaquim José Rodrigues Torres.