DECRETO Nº 2.283 - de 20 de Outubro de 1858
Approva os Estatutos do Instituto Pharmaceutico do Rio de Janeiro.
Attendendo ao que Me requereo Eduardo Julio Janvrot, e de conformidade com a Minha immediata Resolução de 6 do corrente mez, tomada sobre parecer da Secção dos Negocios do Imperio do Conselho d'Estado, exarado em Consulta de 28 de agosto ultimo: Hei por bem Approvar os Estatutos do Instituto Pharmaceutico do Rio de Janeiro, que com este baixão, com a declaração de que as habilitações, que forem conferidas aos alumnos do mesmo Instituto, não os autorisão para o exercicio legal da pharmacia, nem para as matriculas nas faculdades de medicina; o que tudo se deve conformar com os regulamentos respectivos.
O Marquez de Olinda, Conselheiro d'Estado, Presidente do Conselho de Ministros, Ministro e Secretario d'Estado dos Negocios do Imperio, assim o tenha entendido, e faça executar. Palacio do Rio de Janeiro em vinte de Outubro de mil oitocentos cincoenta e oito, trigesimo setimo da Independencia e do Imperio.
Com a Rubrica de Sua Magestade o Imperador.
Marquez de Olinda.
Estatutos do Instituto Pharmaceutico do Rio de Janeiro, a que se refere o Decreto nº 2.283 de 20 de Outubro de 1858
CAPITULO I
Do Instituto e seus fins
Art. 1º O Instituto Pharmaceutico do Rio de Janeiro tem por fim promover por todos os meios a seu alcance o progresso e desenvolvimento da pharmacia em toda a sua extensão.
Art. 2º Para conseguir este fim o Instituto empregará, segundo seus recursos pecuniarios, os seguintes meios:
§ 1º Corresponder-se com as sociedades nacionaes e estrangeiras de igual natureza.
§ 2º Crear huma bibliotheca especialmente pharmaceutica e medica, á disposição de quem a quizer consultar.
§ 3º Publicar hum periodico trimensal com o titulo de «Annaes de Pharmacia».
§ 4º Fundar hum gabinete de sciencias naturaes para os estudos e analyses do Instituto.
§ 5º Organisar hum corpo de praticantes de pharmacia, que serão considerados pensionistas do Instituto.
§ 6º Fundar huma escola, em que se proporcione aos pensionistas do Instituto o estudo dos preparatorios exigidos para o curso de pharmacia na Escola de Medicina.
§ 7º Mandar á Europa os pensionistas do Instituto que mais se tiverem distinguido por sua moralidade e applicação nos estudos preparatorios, e no curso de pharmacia, a fim de aperfeiçoarem-se no estudo da chimica e pharmacia.
§ 8º O estudo e aperfeiçoamento de tudo quanto for concernente á pharmacia e therapeutica.
§ 9º Conferir premios aos descobridores de principios immediatos medicamentosos.
Art. 3º O Instituto compor-se-ha de membros effectivos, titulares, correspondentes, benemeritos, e honorarios.
§ 1º Poderão ser membros effectivos sómente os pharmaceuticos legalmente reconhecidos no Imperio.
§ 2º Poderão ser membros titulares os individuos que cultivarem algum dos ramos das sciencias naturaes.
§ 3º Poderão ser membros benemeritos todos aquelles individuos que tiverem concorrido para as despezas do Instituto com huma quantia ou donativo, superior a cem mil réis.
§ 4º Serão membros honorarios sómente aquelles que tiverem profundos conhecimentos de pharmacia ou medicina.
§ 5º Só poderão ser membros correspondentes os pharmaceuticos e medicos domiciliados fóra da Cidade do Rio de Janeiro, que por seus conhecimentos e amor á sciencia possão cooperar para o progresso do Instituto.
CAPITULO II
Admissão, deveres e direitos dos membros do Instituto
Art. 4º Não será candidato algum admittido no Instituto sem que preceda proposta por escripto assignada pelo proponente, declarando o nome, naturalidade, profissão, estado, residencia, idade, e titulos do proposto.
Art. 5º Lida a proposta em sessão pelo Secretario geral, ficará sobre a mesa até a sessão seguinte, em que será votada por escrutinio secreto; devendo, para que o candidato seja aceito, reunir tres quartos dos votos presentes.
Art. 6º Para socio honorario ou benemerito só poderá ser admittido o candidato que obtiver votação unanime.
Art. 7º Todo o membro effectivo concorrerá com huma joia nunca menor de vinte mil réis, e com a mensalidade de dous mil réis pagos adiantados de tres em tres mezes.
Art. 8º Os membros titulares e correspondentes pagarão sómente a mensalidade acima estabelecida, e pela forma determinada.
Art. 9º Será demittido do Instituto o socio que sem motivo justificado deixar de pagar suas mensalidades durante seis mezes.
Art. 10. O socio effectivo não poderá recusar qualquer cargo ou commissão para que for eleito ou nomeado pela primeira vez.
Art. 11. Deverá assistir ás sessões do Instituto, e servi-lo com suas luzes e esforços, tanto nas discussões e trabalhos scientificos, como nos administrativos.
Art. 12. Receber em seu laboratorio pharmaceutico hum pensionista do Instituto, e dirigi-lo no estudo e pratica da pharmacia.
Art. 13. Os membros titulares e correspondentes, quando presentes, poderão tomar parte nos trabalhos e decisões scientificas e administrativas do Instituto.
Art. 14. Os membros honorarios e benemeritos só poderão tomar parte nas discussões scientificas.
Art. 15. Qualquer membro tem o direito de apresentar por si ou por correspondencia theses, memorias, analyses ou outros trabalhos.
CAPITULO III
Da direcção e trabalhos do Instituto
Art. 16. O Instituto será dirigido por hum Presidente, dous Vice-Presidentes, (1º e 2º), hum Secretario Geral, hum dito Archivista, dous Adjuntos, e hum Thesoureiro.
Art. 17. Para esses cargos só poderão ser votados os socios de que trata o art. 3º § 1º.
Art. 18. As sessões do Instituto serão ordinarias, extraordinarias, e solemnes.
§ 1º As ordinarias para assumptos scientificos serão huma vez por semana, em dia, hora, e lugar previamente annunciados pelo Secretario Geral.
§ 2º As extraordinarias terão lugar sempre que se precisar de tratar de assumptos financeiros, ou que exijão prompta solução.
§ 3º As solemnes nos anniversarios da inauguração do Instituto, e quando se tiver de distribuir premios.
Art. 19. O Instituto não poderá celebrar sessão com menos de seis membros.
CAPITULO IV
Dos funccionarios
Art. 20. Ao Presidente do Instituto compete:
§ 1º Presidir a todos os trabalhos do Instituto.
§ 2º Manter a ordem nas sessões, podendo suspende-los, se assim o julgar necessario.
§ 3º Marcar com antecedencia para cada sessão a ordem do dia.
§ 4º Observar e fazer observar aos demais funccionarios o fiel cumprimento destes Estatutos, do regimento interno e de todas as deliberações do Instituto.
§ 5º Rubricar todos os livros, attestados, e mais documentos do Instituto.
§ 6º Nomear as commissões que forem necessarias.
§ 7º Não votará, excepto na eleição dos funccionarios da Directoria, senão em caso de empate, podendo abster-se disso para submetter o desempate á sorte.
Art. 21. Os Vice-Presidentes segundo a sua ordem substituirão o Presidente em suas faltas ou impedimentos.
Art. 22. O Secretario Geral he o principal agente dos negocios do Instituto, e a seu cargo está:
§ 1º Dar conta em todas as sessões do expediente.
§ 2º Assignar, e expedir a correspondencia do Instituto.
§ 3º Fazer em o livro competente a matricula dos socios segundo a classe a que pertencerem.
§ 4º Apresentar nas sessões anniversarias hum relatorio circumstanciado dos trabalhos do anno social.
§ 5º Matricular em sua devida ordem os pensionistas do Instituto, consignando a par do nome de cada hum as notas de conducta e aproveitamento que lhe forem transmittidas pelo Presidente.
§ 6º Expedir os cartões de matricula dos pensionistas, bem como os attestados de conducta e aproveitamento que devão ser passados por despacho do Presidente.
Art. 23. Compete ao Secretario Archivista:
§ 1º Substituir o Secretario Geral em suas faltas ou impedimentos.
§ 2º Tomar apontamentos do que se passar nas sessões, a fim de confeccionar os actos, rubricando todos os trabalhos, propostas ou indicações remettidas á mesa, e dar com brevidade huma nota de tudo ao Secretario Geral.
§ 3º Archivar, e ter debaixo de sua guarda todos o livros, papeis, jornaes, theses, memorias, e mais objectos do Instituto.
§ 4º Apresentar hum inventario por ordem alphabetica de tudo quanto possuir o Instituto no fim do anno social.
§ 5º Vigiar a fiel entrega de todos os jornaes de que o Instituto for assignante, dando as providencias quando hajão faltas, para que ellas sejão reparadas.
Art. 24. Os 1º e 2º Adjuntos do Secretario substituirão o Secretario Archivista e o Geral em suas faltas ou impedimentos; alêm disso os coadjuvarão em todos os trabalhos á cargo dos mesmos.
Art. 25. Ao Thesoureiro compete:
§ 1º Arrecadar todos os dinheiros pertencentes ao Instituto, pelos quaes ficará responsavel, passando os competentes recibos.
§ 2º Expedir trimensalmente aos socios os recibos de suas mensalidades, e das joias aos recem-admittidos.
§ 3º Ter em dia com toda a clareza e ordem a escripturação dos dinheiros a seu cargo.
§ 4º Executar as ordens de despeza, assignadas pelo Presidente e Secretario Geral.
§ 5º Enviar os diplomas aos socios que tiverem pagos suas joias.
§ 6º Apresentar no fim de cada trimestre, ou quando o Instituto o exigir, o balancete demonstrativo do estado da caixa; e quinze dias antes do fim do anno social o balanço geral da receita e despeza documentada, e o orçamento para o anno vindouro.
§ 7º Empregar, sobre sua responsabilidade, huma pessoa para a cobrança dos dinheiros do Instituto, podendo despender com esse serviço até dez por cento do valor arrecadado.
§ 8º Recolher a hum dos Bancos mais acreditados as sobras dos dinheiros do Instituto, desde a quantia de cem mil réis.
Art. 26. Os funccionarios do Instituto servirão por hum anno, mas poderão ser reeleitos.
CAPITULO V
Dos Annaes de Pharmacia
Art. 27. Os Annaes serão redigidos por hum socio effectivo, eleito todos os annos pelo Instituto.
CAPITULO VI
Dos pensionistas
Art. 28. Os pensionistas do Instituto se dividirão em 1ª e 2ª classe.
Art. 29. Para ser admittido a pensionista de 2ª classe he preciso:
§ 1º Que o candidato tenha mais de dez annos de idade.
§ 2º Que a sua moralidade seja afiançada por parente, curador ou protector.
§ 3º Que saiba ler, escrever, e as quatro operações elementares.
Art. 30. Admittido o candidato, receberá hum cartão de matricula, e se empregará por suas proprias diligencias, ou pelas do Instituto em algum laboratorio pharmaceutico, para cultivar praticamente a pharmacia.
Art. 31. Logo que o pensionista esteja empregado, lançar-se-ha o nome do chefe do laboratorio á margem da sua matricula, bem como a data da entrada, e as condições, se houver.
Art. 32. De tres em tres mezes apresentará o pensionista hum certificado de sua conducta e aproveitamento, passado pelo chefe do estabelecimento em que se achar.
Art. 33. Quando por qualquer motivo o pensionista se despedir, ou for despedido do estabelecimento em que praticava, deverá no mesmo dia ou no immediato apresentar-se ao Presidente do Instituto, ou ao Secretario Geral, a fim de motivar a sua retirada, apresentando o attestado de que trata o art. 32.
Art. 34. O pensionista, que durante dous annos tiver persistencia na pratica da pharmacia, boa conducta moral, zelo, e aproveitamento, poderá ser elevado a pensionista de 1ª classe, devendo antes provar em exame suas habilitações. Alêm dessa elevação, em razão do exame que tiver feito, e das notas de conducta que apresentar, poderá ser premiado pelo Instituto.
Art. 35. Poderá tambem ser admittido a pensionista de 1ª classe o candidato:
§ 1º Que mostrar com documentos valiosos ter exercido a pharmacia durante quatro annos, e o disposto no § 2º do art. 29.
§ 2º Que for approvado no exame de habilitações do art. 34.
Art. 36. O candidato admittido a pensionista de 1ª classe tem os mesmos deveres consignados nos arts. 31, 32 e 33.
Art. 37. Frequentará gratuitamente as aulas de francez e mathematicas do Instituto (art. 2º § 6º).
Art. 38. O pensionista, que sem conhecimento das ditas materias, nellas se habilitar em hum anno para cursar o estudo de pharmacia na Escola de Medicina será premiado com huma medalha de prata, e o que se habilitar em dous annos com huma de bronze.
Art. 39. O pensionista de 1ª classe, que não quizer cursar os estudos superiores da pharmacia na Escola de Medicina, será todavia obrigado a estudar o francez e arithmetica.
Art. 40. O pensionista, que durante tres annos não se tiver habilitado nos preparatorios, ou que for reprovado duas vezes successivas no curso de pharmacia, perderá o direito de estudar a expensas do Instituto.
Art. 41. Ao pensionista pobre, que se achar habilitado para matricular-se no curso de pharmacia, pagará o Instituto as matriculas, e fornecerá os livros necessarios, os quaes o pensionista restituirá no fim de seus estudos. O Instituto fornecerá tambem os livros necessarios para os estudos preparatorios.
Art. 42. Os exames dos pensionistas tanto de preparatorios como do curso de pharmacia serão presenciados por huma commissão de tres membros, nomeada pelo Instituto para as suas ulteriores deliberações.
Art. 43. Em cada anno do curso de pharmacia serão distribuidos tres premios aos pensionistas que se tornarem merecedores de distincção pela sua conducta, talento e aproveitamento, e constarão esses premios do seguinte: o 1º huma medalha de prata, o 2º hum tratado de pharmacia ricamente encadernado, o 3º hum dito encadernado menos ricamente.
Art. 44. O pensionista, que tiver obtido os primeiros premios, poderá ser mandado á Europa á custa do Instituto, a fim de aperfeiçoar-se no estudo da chimica e da pharmacia.
Art. 45. O pensionista, que tiver concluido os seus estudos, será desde logo inscripto membro do Instituto, pagando a joia quando puder, e assignará hum titulo de divida á vista da conta de todas as despezas com elle feitas pelo Instituto, para por meio de prestações com prazos muito favoraveis o resgatar, não devendo nunca ser por tal divida executado.
Art. 46. O pensionista, que por qualquer motivo não quizer dedicar-se aos estudos scientificos, mas que se entregar com zelo e aproveitamento á pratica da pharmacia, permanecendo em huma casa com boa conducta durante tres annos, será premiado pelo Instituto.
CAPITULO VII
Da escola de preparatorios
Art. 47. A escola de preparatorios será regida por hum regulamento especial, approvado pelo Instituto.
Art. 48. Constará de duas cadeiras, huma de lingua franceza, outra de arithmetica e geometria, e seus professores deverão ser pessoas habilitadas perante o Conselho de Instrucção Publica.
CAPITULO VIII
Disposições diversas
Art. 49. O Instituto conferirá medalhas de bronze, prata, ou ouro a todo o individuo residente no Brasil, que descobrir principios immediatos medicamentosos.
Art. 50. Os exames para pensionista de 1ª classe serão feitos pelo modo seguinte:
§ 1º Na occasião do exame o Presidente nomeará tres membros effectivos para examinarem o candidato.
§ 2º O exame será feito perante os membros do Instituto reunidos em sessão.
§ 3º Cada examinador arguirá por espaço de quinze minutos.
§ 4º O Presidente do Instituto, que será tambem o Presidente dos exames, poderá arguir o candidato durante o tempo marcado acima.
§ 5º Findo o exame se procederá immediatamente á votação por escrutinio secreto, em que tomarão parte a mesa e os examinadores.
§ 6º Nos exames de habilitação para a 1ª classe dos pensionistas da 2ª, o escrutinio correrá duas vezes, a 1ª para que possa ser admittido, e a 2ª para que possa ser premiado, excepto se tiver sido reprovado na 1ª vez.
Art. 51. Se o candidato for reprovado, só poderá ser admittido a novo exame depois de decorridos seis mezes.
Art. 52. O anno social principiará no dia da inauguração do Instituto.
Art. 53. A eleição dos funccionarios será feita alguns dias antes do anniversario da inauguração do Instituto, e a posse oito dias depois do mesmo.
Art. 54. Em quanto os rendimentos do Instituto não permittirem a execução de todas as ideias constantes dos §§ do art. 2º, o Instituto procederá segundo as suas circumstancias.
Art. 55. Os empregados, que forem precisos para o serviço do Instituto e da escola de preparatorios serão nomeados pela mesa; suas gratificações porêm serão arbitradas pelo Instituto.
Art. 56. O Presidente do Instituto será sempre o Director da escola de preparatorios e dos pensionistas, sendo ajudado nesse cargo pelos outros membros da mesa.
Art. 57. Serão propriedade do Instituto todos os trabalhos que forem lidos nas suas sessões.
Art. 58. As commissões nomeadas para qualquer trabalho serão obrigadas a apresenta-lo dentro de quinze dias, e em casos extraordinarios dentro de dois mezes.
Art. 59. Os membros, que durante quatro annos consecutivos exercerem qualquer cargo do Instituto com zelo e assiduidade, serão premiados com o titulo de benemeritos, e aquelles, que servirem dez annos, com o de honorarios.
Art. 60. O Lente de pharmacia da Escola de Medicina será o Presidente honorario do Instituto.
Art. 61. Quando se dê o caso de dissolução do Instituto, o seu espolio e o dinheiro, que existir em sua caixa, reverterão para o Hospicio de Santa Tereza.
Art. 62. Os presentes Estatutos não poderão ser reformados na sua totalidade antes de decorridos dous annos, e nunca, em citcumstancia alguma se poderão alterar seus fins.
Rio de Janeiro em 7 de Agosto de 1858. - Assignados:
Presidente, Eduardo Julio Janvrot. - Secretario Geral, Francisco Zacharias Alves. - Secretario Archivista, Alexandre dos Santos Gomes de Paula. - Thesoureiro, Francisco Vieira de Almeida.